Por que pássaros não sentem um choque ao tocar no chão após pousar em um fio de alta tensão?

16 de setembro, 2024 às 14:18 | Postado em Corrente contínua e alternada, Eletricidade, Eletrostática

É senso comum que pássaros pousam em fios de alta tensão sem problemas porque um circuito fechado não é formado com o pássaro.

Porém, isso não deveria fazer o pássaro ser eletrizado? Ao tocar em um fio de 13kV, meu entendimento é que o pássaro iria imediatamente assumir aquele potencial, e, para isso, assumindo que inicialmente o pássaro estava com o mesmo potencial da terra, cargas seriam transferidas para o pássaro. Isso já não deveria causar um choque no pássaro?

Depois, ao pousar no chão ou em algum objeto aterrado, não poderia também ocorrer um choque quando o pássaro fosse descarregado?

E, por fim, o que diferencia essa situação da situação corriqueira onde um humano fricciona seu corpo ou roupa com outro objeto, é eletrizado, e realmente sente um choque ao tocar em outro objeto?

Muito obrigado!

Felipe

Quando o pássaro se carrega para atingir o potencial elétrico do fio  circulam por ele correntes elétricas.

E enquanto o pássaro está sentado sobre o fio da rede de tensão alternada de 13 kV  o potencial elétrico do fio e do pássaro está variando pois 13kV é a tensão eficaz, o que implica que o valor instantâneo de tensão no fio é variável, passando em alguns momentos de 13kV, atingindo extremos de +18kV e -18kV. Então a carga elétrica no pássaro é variável e por ele circula uma corrente elétrica alternada. Mas essas correntes são muito pequenas (um modelo para o pássaro no fio é de um capacitor de baixíssima capacitância, portanto com enorme impedância, sob tensão alternada), não tendo efeitos fisiológicos importantes.

Nesses tempos secos acontecidos em boa parte do Brasil  o simples deslocamento de uma pessoa sobre um carpete é suficiente para eletrizá-la e produzir centelhas elétricas incômodas (associadas a tensões elétricas da ordem de 10kV conforme discutido aqui) quando a pessoa toca a maçaneta de uma porta por exemplo.

Uma descarga em alta tensão pode ser inócua, não apresentando efeitos sérios, se a energia elétrica armazenada antes da descarga é pequena.

Ora,  em um corpo com as dimensões de um pássaro a máxima energia elétrica que pode estar nele armazenada (tal acontece quando o seu potencial elétrico é da ordem de dezenas de quilovolts em relação à terra) é muito pequena, muito menor do que a energia elétrica que pode ser armazenada em um corpo com a dimensão de um homem sob o mesmo potencial elétrico.

Portanto, ainda que o pássaro voe eletrizado com a máxima carga compatível com um potencial de dezenas de quilovolts e ainda que o seu descarregamento seja brusco (corpos eletrizados lentamente descarregam em ambientes com alguma umidade), não há qualquer perigo de ser eletrocutado pois a sua descarga envolve pouca energia elétrica. Vide também  O risco da alta tensão em Geradores Eletrostáticos.

Mais sobre o tema dos pássaros e fios eletrificados em  Passarinhos e a diferença de potencial ao longo da linha de transmissão.

“Docendo discimus.” (Seneca)