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Einstein em 1920 admitiu a existência do éter descartado em 1905 pela Teoria da Relatividade Restrita?

Professor

Em mais de um vídeo da internet há a afirmação de que em 1920 Einstein admitiu o “éter luminífero” de Maxwell, eliminado pela Teoria da Relatividade Restrita, em uma palestra. Terra-chatos  usam também esta afirmação em vídeos sobre o éter e a Terra Plana. O senhor poderia esclarecer se isso é verdade?

 

Respondido por: Professores Fernando Lang da Silveira (IF-UFRGS) e Jacques Homme

Começamos a responder o questionamento notando que o termo éter aparece muitas vezes ao longo da história de ciência com significados  diferentes. À guisa de exemplo lembramos que na Antiga Grécia  Aristóteles usou o termo éter como o quinto elemento ou quintessência, isto é, a substância da qual eram constituídos os corpos celestes pois os corpos terrenos eram compostos por outros quatro elementos: fogo, ar, água e terra.

Depois encontramos em Descartes a ideia de éter como uma substância sutil que preenchia os espaços entre os corpos celestes e que desempenhou um papel importante na Mecânica Cartesiana, posteriormente superada pela Mecânica de Newton. Vide por exemplo Achatamento da Terra segundo a Mecânica Cartesiana e a Mecânica Newtoniana.

O termo éter é portanto polissêmico, frequentemente usado para designar coisas que ninguém sabe muito bem o que são e que se prestam a todos os tipos de empulhações ao estilo da anacrônica e esdúxula Terra Plana. Um caso notório do uso do termo na exploração da ignorância e da fé alheia (muito bem reproduzido pelos terra-chatos) com fins de obter vantagens financeiras aconteceu no EUA no final do século XIX: a utilização da energia etérea na máquina “maravilhosa” de John Keely.

A ideia científica do éter reaparece no século XIX em Maxwell e outros cientistas como o meio no qual a luz se propagava e o fenômenos eletromagnéticos aconterciam: o éter lumínífero. Muitas tentativas de detecção do vento de éter foram feitas e são célebres os experimentos de Michelson-Morley, no final do século XIX, sempre com resultados negativos. Vide Leis de Maxwell e ondas eletromagnéticas  e NÃO é verdade que os experimentos de Michelson-Morley derrubaram a “teoria do éter luminífero”!

Na Teoria da Relatividade Restrita (1905) Einstein tornou supérfluo e desnecessário o éter luminífero para a compreensão da propagação da luz e dos fenômenos eletromagnéticos.

Em 1916 Einstein propôs a sua Teoria da Relatividade Geral (TRG) que continha uma nova explicação para a Gravitação. Há diversas postagens no CREF sobre a TRG e indico elas as seguintes:   Força gravitacional ou curvatura do espaço-tempo? , Ondas gravitacionais e Graviton e Detecção de ondas gravitacionais: por que seriam estas ondas originadas na fusão de dois buracos negros e não de algum outro evento?

Em 05/05/1920 Einstein realizou uma palestra (aula inaugural) em Leyden, intitulada “Éter e a Teoria da Relatividade”. Original em alemão: Volume 7: The Berlin Years: Writings, 1918-1921 Page 308. Abaixo a foto do ecientista em 1921 encontrada Wikipedia.

Nesta palestra Einstein apresenta o conceito de éter, sua evolução histórica e o impacto das suas Teorias da Relatividade Restrita e Geral nos conceitos clássicos, newtoniano, maxwelliano, hertziano e machiano de éter luminífero.

Ele apresenta uma discussão epistemológica do conceito de éter traçando um paralelo que leva o leitor à apresentação do conceito einsteiniano.

Einstein contrapõe a visão mística herdada dos gregos por Newton, a visão mecanicista inconciliável com a visão eletromagnética de Maxwell, Hertz e outros, a tentativa de redefinição do conceito por Ernst Mach, ainda incapaz de unificar o entendimento das grandes visões da física do século XIX, a mecânica e a eletromagnética.

Einstein finaliza sua aula, concedendo uma licença semântica, reafirmando que o Éter Luminífero, ou meio material para propagação da interação eletromagnética, é supérfulo, mas que ainda poder-se-ia falar em “Éter da Teoria da Relatividade” como as características físicas do espaço-tempo . Ao final da palestra ele assim se expressou:

Recapitulando, podemos dizer que de acordo com a Teoria Geral da Relatividade, o espaço é dotado de qualidades físicas; nesse sentido, portanto, existe um éter. (…) Mas este éter não pode ser pensado como dotado da qualidade característica de meio ponderável, como consistindo de partes que podem ser rastreadas através do tempo. A ideia de movimento pode não ser aplicada a ele.

Nota-se então que de forma alguma Einstein abdicou das suas teorias, tampouco admitiu que o conceito do Éter Material, superado pela Teoria da Relatividade Restrita que explicou os resultados negativos dos experimentos de detecção do vento de éter (como os experimentos de Michelson-Morley), houvesse voltado às suas considerações.

Ele finalizou sua aula especulando que a discussão sobre a realidade do éter (não esqueçamos que falamos do ano de 1920) haveria de ser mais bem endereçada com a evolução dos incipientes conceitos de Física Quântica de Campos. Uma especulação brilhante que anteviu um campo teórico que só alcançaria sua maturidade 27 anos após esta palestra.

Abaixo vai a tradução da palestra de 1920 realizada pelo professor Jacques Homme, também disponível em documento pdf.

Ether and the Theory of Relativity

The collected papes of Albert Einstein

Aula inaugural proferida em 05/05/1920 na Universidade de Leyden – http://einsteinpapers.press.princeton.edu/vol7-doc/

Original em alemão: Volume 7: The Berlin Years: Writings, 1918-1921 Page 308 – http://einsteinpapers.press.princeton.edu/vol7-doc/356

Éter e a Teoria da Relatividade

Como  acontece com a ideia de matéria ponderável, que é derivada da abstração da vida cotidiana, os físicos colocam a ideia da existência de outro tipo de matéria, o éter?

É provável que a explicação seja procurada nos fenômenos que deram origem à teoria da ação à distância e nas propriedades da luz que levaram à teoria ondulatória. Deixemos um pouco de tempo para a consideração desses dois assuntos.

Fora da física, não sabemos nada de ação à distância. Quando tentamos conectar a causa e o efeito nas experiências que os objetos naturais nos proporcionam, parece primeiro como se não houvesse outras ações mútuas do que as de contato imediato, por exemplo,  a comunicação de movimento por impacto, empurrando e puxando, aquecendo ou induzindo combustão por meio de uma chama, etc. E isto é verdade mesmo para o peso na experiência cotidiana, que em um sentido de ação à distância, desempenha um papel muito importante.

Mas, como na experiência diária, o peso dos corpos nos parece algo constante, algo não vinculado a qualquer causa que seja variável no tempo ou no lugar, na vida cotidiana especulamos sobre a causa da gravidade e, portanto, não nos tornamos conscientes de seu caráter como ação à distância.

Foi a teoria da gravitação de Newton que primeiro atribui uma causa para a gravidade ao interpretá-la como uma ação à distância, proveniente de massas.

A teoria de Newton é provavelmente o maior passo já feito no esforço para estabelecer o nexo causal dos fenômenos naturais. E, no entanto, essa teoria provocou uma viva sensação de desconforto entre os contemporâneos de Newton, porque parecia estar em conflito com o princípio decorrente do resto da experiência, que só pode haver ação recíproca exclusivamente através do contato e não através de uma ação instantânea à distância.

É somente com relutância que o desejo de conhecimento do homem persiste em um dualismo desse tipo. Como a unidade foi preservada em sua compreensão das forças da natureza?

Ou tentando considerar as forças de contato como forças de ação a distância que são reconhecidamente observáveis apenas a uma distância muito pequena. Essa foi a estrada que a maioria dos seguidores de Newton (que estavam inteiramente encantados pela sua doutrina) preferiram tomar, assumindo que a ação newtoniana à distância apenas parece ser ação instantânea à distância, mas que na verdade é transmitida, seja por movimentos ou pela deformação elástica, por um meio permeando todo o espaço.

Assim, o esforço para uma visão unificada da natureza das forças levou à hipótese de um éter.

Esta hipótese, com certeza, não trouxe, em primeiro lugar, qualquer avanço na teoria da gravitação ou da física em geral, de modo que se tornou costumeiro tratar a lei da força de Newton como um axioma irredutível.

Mas a hipótese do éter era obrigada a desempenhar alguma função na ciência física, mesmo que, no início, apenas uma função latente.

Quando na primeira metade do século XIX, a semelhança de grande alcance foi estabelecida entre as propriedades da luz e das de ondas elásticas em meios materiais, a hipótese do éter encontrou novo apoio.

Parecia indiscutível que a luz deveria ser interpretada como um processo vibratório em um meio inerte elástico que preenchia todo o espaço.

Também parecia ser uma consequência necessária do fato de que a luz pode ser polarizada que este meio, o éter, deveria ter natureza de um corpo sólido, pois ondas transversais não são possíveis em um fluidos, mas apenas em um sólidos.

Assim, os físicos foram obrigados a chegar à teoria do éter luminífero quase rígido, cujas partes não podem realizar nenhum movimento em relação a outras partes, exceto pelos pequenos movimentos de deformação que correspondem a ondas de luz.

Esta teoria, chamada a teoria do éter luminífero estacionário, também encontrou um forte apoio em um experimento que também foi de fundamental importância na teoria da relatividade especial, o experimento de Fizeau, do qual obrigatoriamente inferiria que o éter luminífero não participaria dos movimentos dos corpos. O fenômeno da aberração também favorecia a teoria do éter quase rígido.

O desenvolvimento da teoria da eletricidade no caminho aberto por Maxwell e Lorentz propiciou que nossas ideias sobre o éter tomassem um rumo bastante peculiar e inesperado.

Para o próprio Maxwell o éter ainda tinha propriedades que eram puramente mecânicas, embora de um tipo muito mais complicado do que as propriedades mecânicas dos corpos sólidos tangíveis.

Mas nem Maxwell nem seus seguidores conseguiram elaborar um modelo mecânico para o éter que pudesse fornecer uma interpretação mecânica satisfatória das leis de Maxwell do campo eletromagnético.

As leis eram claras e simples, as interpretações mecânicas eram desajeitadas e contraditórias.

Quase imperceptivelmente, os físicos teóricos se adaptaram a uma situação que, do ponto de vista do seu programa mecânico, era muito desestimulante.

Eles foram particularmente influenciados pelas investigações eletrodinâmicas de Heinrich Hertz. Embora tenham demandado uma teoria conclusiva que contivesse os conceitos fundamentais pertencentes exclusivamente à mecânica (por exemplo, densidades, velocidades, deformações, tensões), eles gradualmente se acostumaram a admitir a força elétrica e magnética como conceitos fundamentais lado a lado com os da mecânica, sem exigir uma interpretação mecânica para eles.

Assim, a visão puramente mecânica da natureza foi gradualmente abandonada. Mas essa mudança levou a um dualismo fundamental que, a longo prazo, era insuportável. A alternativa agora era procurada na direção inversa, reduzindo os princípios da mecânica para os da eletricidade, e isso se deveu especialmente a que a estrita validade das equações da mecânica de Newton ter sido abalada pelas experiências com raios beta e raios catódicos rápidos.

Este dualismo ainda reside de forma injustificada na teoria de Hertz, onde a matéria aparece não apenas como portadora de velocidades, energia cinética e pressões mecânicas, mas também como portadora de campos eletromagnéticos.

Uma vez que tais campos também ocorrem no vácuo (isto é, no Éter livre) o Éter também aparece como portador de campos eletromagnéticos.

O Éter parece indistinguível em suas funções da matéria ordinária. Dentro da matéria, ela faz parte do movimento da matéria e no espaço vazio tem em toda parte uma velocidade; de modo que o éter tenha uma velocidade definitivamente atribuída em todo o espaço. Não há diferença fundamental entre o éter de Hertz e a matéria ponderável (que em parte subsiste no Éter).

A teoria de Hertz sofreu não só pelo defeito de atribuir à matéria e ao éter, por um lado estados mecânicos e, por outro lado, estados elétricos,não mantendo nenhuma relação conceitual entre si; mas também porque estava em desacordo com o resultado do importante experimento de Fizeau sobre a velocidade da propagação da luz nos fluidos em movimento e com outros resultados experimentais estabelecidos.

Este fora o estado de coisas quando H. A. Lorentz entrou na cena.

Ele conseguiu que a teoria estivesse em harmonia com a experiência por meio de uma maravilhosa simplificação de princípios teóricos.

Ele conseguiu isso, o avanço mais importante na teoria da eletricidade desde Maxwell, eliminando o éter do escopo mecânico, e da matéria suas qualidades eletromagnéticas.

Como no espaço vazio, assim também no interior dos corpos materiais, o éter, e não a matéria examinada atomicamente, era exclusivamente o suporte dos campos eletromagnéticos.

Segundo Lorentz, as partículas elementares da matéria sozinhas são capazes de realizar movimentos; sua atividade eletromagnética é inteiramente confinada ao carregamento de cargas elétricas. Assim, Lorentz conseguiu reduzir todos os acontecimentos eletromagnéticos às equações de Maxwell para o espaço livre.

Quanto à natureza mecânica do éter Lorentziano, pode-se dizer isso, de um modo um tanto jocoso, que a imobilidade é a única propriedade mecânica de que não foi privado por H. A. Lorentz. Pode-se acrescentar que toda a mudança na concepção do éter que a teoria da relatividade especial provocou, consistiu em retirar do éter sua última qualidade mecânica, ou seja, sua imobilidade. Como isso deve ser entendido será imediatamente exposto.

A teoria do espaço-tempo e a cinemática da teoria da relatividade especial foram modeladas na teoria Maxwell-Lorentz do campo eletromagnético.

Esta teoria, portanto, satisfaz as condições da teoria da relatividade especial, mas, quando vista a partir desta última, adquire um aspecto novo.

Se K é um sistema de coordenadas relativamente ao qual o éter Lorentziano está em repouso, as equações de Maxwell-Lorentz são válidas principalmente com referência a K.

Mas, pela teoria da relatividade especial, as mesmas equações sem qualquer alteração de significado também possuem em relação a qualquer novo sistema de coordenadas K ‘que está se movendo em translação uniforme em relação a K.

Agora vem a questão angustiante: Por que eu deveria, na teoria, distinguir o sistema K acima de todos os sistemas K’, que são fisicamente equivalentes a ele em todos os aspectos, assumindo que o éter está em repouso relativamente ao sistema K?

Para o (físico) teórico, uma assimetria na estrutura teórica, sem assimetria correspondente no sistema de experiência, é intolerável.

Se assumirmos que o éter está em repouso em relação a K, mas em movimento em relação a K’, a equivalência física de K e K’ a mim parece do ponto de vista lógico, na verdade, não totalmente incorreta, no entanto, (totalmente) inaceitável.

A próxima posição que foi possível enfrentar em face desse estado de coisas pareceu ser a seguinte. O éter não existe. Os campos eletromagnéticos não são estados de um meio, e não estão ligados a qualquer portador, mas são realidades independentes que não são redutíveis a qualquer outra coisa, exatamente como os átomos da matéria ponderável.

Essa concepção sugere-se mais prontamente como, segundo a teoria de Lorentz, radiação eletromagnética, como matéria ponderável, traz impulso e energia com ela, e como, segundo a teoria da relatividade especial, a matéria e a radiação são apenas formas especiais de energia distribuída, massa ponderável perdendo seu isolamento e aparecendo como uma forma especial de energia.

Uma reflexão mais cuidadosa nos ensina, no entanto, que a teoria da relatividade especial não nos obriga a negar o éter.

Podemos assumir a existência de um éter; só devemos desistir de atribuir um estado de movimento definitivo, isto é, devemos, por abstração, tirar dela a última característica mecânica que Lorentz ainda deixara.

Mais tarde, veremos que este ponto de vista, cuja concepção deve imediatamente se esforçar para tornar mais inteligível por uma comparação um tanto parada, é justificado pelos resultados da teoria geral da relatividade.

Pensemos em ondas na superfície da água.

Aqui podemos descrever duas coisas inteiramente diferentes. Ou podemos observar como a superfície ondulatória que forma a fronteira entre água e ar altera-se ao longo do tempo; ou, com a ajuda de pequenos flutuadores, por exemplo, podemos observar como a posição das partículas separadas de água altera ao longo do tempo.

Se a existência de tais flutuadores para rastrear o movimento das partículas de um fluido fosse uma impossibilidade fundamental na física se, de fato, nada mais fosse observável do que a forma do espaço ocupado pela água, pois varia no tempo, devemos não ter fundamento para a suposição de que a água é constituída por partículas móveis, mas poderíamos caracterizá-la como um meio.

Temos algo assim no campo eletromagnético. Pois podemos imaginar o campo como consistindo em linhas de força. Se desejamos interpretar essas linhas de força como algo material no sentido comum, somos tentados a interpretar os processos dinâmicos como movimentos dessas linhas de força, de modo que cada linha de força separada seja rastreada ao longo do tempo. Contudo, é bem conhecido que essa maneira de considerar o campo eletromagnético leva a contradições.

Generalizando devemos dizer isso: Pode se supor objetos físicos aos quais a ideia de movimento não pode ser aplicada. Eles podem não ser pensados como constituídos de partículas que se permitem ser rastreadas separadamente através do tempo.

Na linguagem de Minkowski, isso é expresso da seguinte maneira: nem toda conformação estendida no mundo de quatro dimensões pode ser considerada como composta por “worldthreads” (trajetórias).

A teoria da relatividade especial proíbe-nos de assumir que o éter consiste em partículas observáveis através do tempo, mas a hipótese do éter em si não está em conflito com a teoria da relatividade especial.

Somente nós devemos evitar atribuir um estado de movimento ao éter.

Certamente, do ponto de vista da teoria da relatividade especial, a hipótese do éter parece ser, em primeiro lugar, uma hipótese vazia. Nas equações do campo eletromagnético ocorrem, além das densidades da carga elétrica, apenas as intensidades do campo.

A evolução dos processos eletromagnéticos no vácuo parece ser completamente determinada por essas equações, não influenciadas por outras quantidades físicas.

Os campos eletromagnéticos aparecem como as últimas realidades irredutíveis e, a princípio, parece supérfluo postular um éter como meio homogêneo e isotrópico e prever os campos eletromagnéticos como estados desse meio.

Mas, por outro lado, há um argumento de peso a ser aduzido em favor da hipótese do éter. Para negar o éter deve-se em última instância, assumir que o espaço vazio não possui qualidades físicas.

Os fatos fundamentais da mecânica não se harmonizam com essa visão.

O comportamento mecânico de um sistema material que flui livremente no espaço vazio, depende não apenas das posições relativas (distâncias) e das velocidades relativas, mas também do seu estado de rotação, que fisicamente pode ser tomado como uma característica que não pertence ao sistema em si. Para poder considerar a rotação do sistema, pelo menos formalmente como algo real, Newton objetiviza o espaço.

Uma vez que ele classifica seu espaço absoluto junto com coisas reais, para ele, a rotação em relação a um espaço absoluto também é algo real.

Newton poderia não menos bem ter chamado seu espaço absoluto “ Ether ”; o essencial é meramente que, além dos objetos observáveis, outra coisa, que não é perceptível, deve ser vista como real, para permitir que a aceleração ou a rotação sejam vistas como algo real.

É verdade que Mach tentou evitar ter de aceitar algo real que não fosse observável, tentando substituir na mecânica uma aceleração média com referência à totalidade das massas no universo em lugar de uma aceleração com referência ao espaço absoluto.

Mas a resistência inercial contra a aceleração relativa de massas distantes pressupõe ação à distância; e como o físico moderno não acredita que ele possa aceitar esta ação à distância, ele volta mais uma vez, segundo Mach, para o éter, que deve servir como meio para os efeitos da inércia.

Mas essa concepção do éter a que somos levados pelo modo de pensar de Mach difere essencialmente do éter, tal como foi concebido por Newton, por Fresnel e por Lorentz.

O éter de Mach não só condiciona o comportamento de massas inertes, mas também está condicionado pelo seu estado.

A ideia de Mach encontra seu pleno desenvolvimento no éter da teoria geral da relatividade.

De acordo com esta teoria, as qualidades métricas do continuum do espaço-tempo diferem no ambiente de diferentes pontos do espaço-tempo e estão parcialmente condicionadas pela matéria existente fora do território considerado.

Essa variabilidade espaço-tempo das relações recíprocas dos padrões de espaço e de tempo, ou, talvez, o reconhecimento do fato de que o “espaço vazio” na sua relação física não é homogêneo nem isotrópico, obrigou-nos a descrever seu estado por dez funções (os potenciais de gravidade g), pensando-se, finalmente, que descartaria a visão de que o espaço é fisicamente vazio.

Mas com isso a concepção do éter adquiriu novamente um conteúdo inteligível, embora este conteúdo difere amplamente daquele do éter da teoria ondulatória mecânica da luz.

O éter da teoria geral da relatividade é um meio que é desprovido de todas as qualidades mecânicas e cinemáticas, mas ajuda a determinar eventos mecânicos (e eletromagnéticos).

O que é fundamentalmente novo no éter da teoria geral da relatividade em oposição ao éter de Lorentz consiste nisso, que o estado do primeiro é em todo lugar determinado pelas conexões com a matéria e o estado do éter em lugares vizinhos,e são passíveis de lei na forma de equações diferenciais; considerando que o estado do éter Lorentziano na ausência de campos eletromagnéticos está condicionado por nada fora de si, e é em todos os lugares o mesmo.

O éter da teoria geral da relatividade é transmutado conceitualmente no éter de Lorentz se substituímos constantes para as funções do espaço que descrevem o primeiro, desconsiderando as causas que condicionam seu estado.

Assim, também podemos dizer, penso eu, que o éter da teoria geral da relatividade é o resultado do éter Lorentziano, através da relativização.

Quanto à parte que o novo éter deve desempenhar na física do futuro, ainda não estamos claros. Sabemos que determina as relações métricas no continuum espaço-tempo, e. as possibilidades configuráveis de corpos sólidos, bem como os campos gravitacionais; mas não sabemos se tem uma participação essencial na estrutura das partículas elétricas elementares que constituem matéria.

Nem sabemos se é apenas na proximidade de massas ponderáveis que sua estrutura difere essencialmente da do éter Lorentziano; se a geometria de espaços de extensão cósmica é aproximadamente euclidiana. Mas podemos afirmar, por meio das equações relativísticas da gravitação, que deve haver uma separação das relações euclidianas, com espaços de ordem cósmica de magnitude, se existir uma densidade média positiva, não importa quão pequena, da matéria no universo. Neste caso, o universo deve, necessariamente, ser espacialmente ilimitado e de magnitude finita, sendo sua magnitude determinada pelo valor dessa densidade média.

Se considerarmos o campo gravitacional e o campo eletromagnético do ponto de vista da hipótese do éter, encontramos uma diferença notável entre os dois. Não pode haver espaço nem qualquer parte do espaço sem potenciais gravitacionais; pois estes conferem ao espaço suas qualidades métricas, sem as quais não pode ser imaginado. A existência do campo gravitacional está inseparavelmente ligada à existência do espaço. Por outro lado, uma parte do espaço pode muito bem ser imaginada sem um campo eletromagnético; assim, em contraste com o campo gravitacional, o campo eletromagnético parece ser apenas secundariamente ligado ao éter, sendo a natureza formal do campo eletromagnético ainda não determinada de modo algum pelo éter gravitacional. Do estado atual da teoria parece que o campo eletromagnético, em oposição ao campo gravitacional, se baseia em um motivo formal inteiramente novo, como se a natureza também tivesse dotado o éter gravitacional com campos de outro tipo, por exemplo, com campos de potencial escalar, em vez de campos do tipo eletromagnético.

Uma vez que, segundo as nossas concepções atuais, as partículas elementares da matéria também são, em sua essência, nada além das condensações do campo eletromagnético, nossa visão atual do universo apresenta duas realidades completamente separadas entre si conceitualmente, embora relacionadas causalmente, ou seja, , éter gravitacional e campo eletromagnético, ou como eles também podem ser chamados de espaço e matéria.

Evidentemente seria um grande avanço se pudéssemos ter sucesso em compreender o campo gravitacional e o campo eletromagnético em conjunto como uma conformação unificada.

Então, pela primeira vez, a época da física teórica fundada por Faraday e Maxwell alcançaria uma conclusão satisfatória. O contraste entre éter e matéria desapareceria e, através da teoria geral da relatividade, toda a física se tornaria um sistema completo de pensamento, como geometria, cinemática e a teoria da gravitação.

Uma tentativa extremamente engenhosa nessa direção foi feita pelo matemático H. Weyl; mas eu não acredito que sua teoria fará seu fundamento em relação à realidade.

Além disso, ao contemplar o futuro imediato da física teórica, não devemos incondicionalmente rejeitar a possibilidade de que os fatos incluídos na teoria quântica possam estabelecer limites para a teoria do campo além da qual não pode passar.

Recapitulando, podemos dizer que de acordo com a teoria geral da relatividade, o espaço é dotado de qualidades físicas; nesse sentido, portanto, existe um éter.

De acordo com a teoria geral da relatividade, o espaço sem éter é impensável; pois, em tal espaço, não só não haveria propagação de luz, mas também nenhuma possibilidade de existência para padrões de espaço e tempo (varas de medição e relógios), nem, portanto, intervalos espaço-tempo no sentido físico.

Mas este éter não pode ser pensado como dotado da qualidade característica de meio ponderável, como consistindo de partes que podem ser rastreadas através do tempo. A idéia de movimento pode não ser aplicada a ele.

 

OBSERVAÇÃO: infelizmente o Prof. Jacques Homme, tradutor da palestra do Einstein, faleceu em 02/02/2020.

Visualizações entre 27 de maio de 2013 e novembro de 2017: 1498.


5 comentários em “Einstein em 1920 admitiu a existência do éter descartado em 1905 pela Teoria da Relatividade Restrita?

  1. MrBiTs disse:

    Estimado Prof. Jacques Homme e o seu indefectível “ANIMAL DE TETAS, CASCOS E CORNOS” deixará muitas saudades. Grande perda no combate ao obscurantismo.

  2. Jose Edson disse:

    Pelo texto apresentado, Einstein não admite a existência do éter, admite sim sua estrutura espaço-tempo como uma espécie de éter. O meio ressurge agora como proposta não só de existência mais de estrutura única e fundamental do Universo. O meio denominado de Eletroéter, fundamenta toda existência com base no modelo gravitacional proposto pela Teoria do Eletroéter. Este sistema gravitacional diferencia de Newton na definição e de Einstein no contexto. O meio espaço tempo de Einstein, com distorção caracterizando gravidade não determina causa mais efeito. A gravidade da Teoria do Eletroéter, define causa e responde a velha pergunta feira a Newton e que continua sem resposta . O que é gravidade ?

  3. Luli disse:

    Mas tem ou não tem o Éter?

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