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Detecção de tsunami pelas estações DART

Caro professor Lang

Vi seu comentário em um vídeo do YT sobre a dificuldade de detecção dos tsunamis em alto-mar devido à pequena amplitude que é de apenas alguns centímetros. Fiquei curioso em saber com então como eles são detectados. O sr. poderia explicar? Agradeço antecipadamente.

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - IF-UFRGS

Um tsunami em alto-mar, onde a espessura da lâmina de água é de alguns quilômetros,  possui amplitude de menos de um metro usualmente; ao atingir águas costeiras menos profundas aumenta sua amplitude conforme discutido em  Tsunami são ondas gigantes? O que isso de fato significa?

Ondas marítimas “normais” em alto-mar, com comprimento de onda de dezenas ou centenas de metros, podem ter amplitude de muitos metros (é o caso das ondas de tempestade). A detecção de um tsunami em alto-mar, devido ao seu grande comprimento de onda de dezenas ou até centenas de quilômetros, é difícil de ser realizada pois a distância que separa a região do oceano não perturbada por ele da sua crista é de dezenas ou centenas de quilômetros. Ou seja, o nível da superfície das águas muda lentamente devido ao tsunami, podendo demorar muitos minutos para se elevar ou baixar por menos de um metro. Para uma onda “normal” a mudança do nível da água em um particular local do oceano ocorre em intervalos de tempo de alguns segundos.

Desta forma, se uma embarcação estiver em alto-mar, enquanto é fácil para pessoas a bordo reconhecer visualmente ou sentir o balanço de ondas “normais” (isto é, sentir os efeitos inerciais devidos às acelerações que a onda transmite ao barco), um tsunami passa desapercebido. “O tsunami que devastou Sanriku em 1896 passou desapercebido para os pescadores que se encontravam a alguns quilômetros da costa, navegando em frágeis embarcações; na manhã seguinte, quando retornaram para casa, ficaram estupefatos com a destruição verificada.” [1]

A detecção de tsunami é feita em alto-mar pelo sistema de estações DART (Deep-ocean Assessment and Reporting of Tsunamis). Este sistema é constituído por dezenas de estações localizadas nos oceanos Índico, Pacífico, Atlântico e Mar do Caribe. A Figura 1 mostra de forma esquematizada uma estação DART.

As estações estão fundeadas em locais dos oceanos com lâminas de água com espessura entre 1km e 6km, portanto em alto-mar. O “tsunameter” (medidor de tsunami indicado no lado esquerdo inferior da Figura 1), localizado junto ao leito do oceano, possui sensores de pressão e temperatura fazendo medidas que são convertidas em espessura da lâmina de água (altura da superfície do oceano em relação ao solo). Estas medidas são transmitidas via satélite, a partir da boia que flutua na superfície do mar (indicada na Figura 1) para os Centros de Alerta de Tsunami. Estes centros, analisando também as ondas sísmicas originadas por um terremoto, podem decidir se o movimento sísmico ocorreu em um local abaixo do oceano. Em caso de o terremoto acontecer embaixo de uma lâmina de água com espessura de um ou mais quilômetros pode ter sido originado um tsunami; se passar por uma estação DART ele será confirmado.

Analisando a evolução temporal da espessura da lâmina de água medida pelas estações DART se pode detectar a passagem de um tsunami pois ele produz mudanças lentas no nível do oceano enquanto as ondas “normais” as produzem de forma rápida. Os dados gerados pelas estações DART estão disponíveis na internet e a seguir exemplifica-se com as medidas realizadas pela estação Dart 21413 (localizada a 700 milhas náuticas do sudeste do Japão), que em 11/03/2011 detectou o tsunami consequente do terremoto Tōhoku que assolou o Japão. Os dados que foram usados estão disponíveis em [2].

As estações Dart monitoram, no “modo padrão”, a espessura da lâmina de água produzindo uma medida a cada 15 minutos. Entretanto uma estação pode produzir medidas rápidas quando o “modo evento” é ativado. Tal ativação acontece, ou por decisão do software da própria estação ao identificar a possibilidade de um tsunami, ou por um comando que chega à estação via satélite, oriundo dos previsores de tsunami. No “modo evento” as medidas passam a ser feitas a cada 15 segundos durante vários minutos e depois por médias de 1minuto durante quatro horas.

A Figura 2  é o gráfico da espessura da lâmina de água na estação DART 21413 em função do tempo no dia 11/03/2011. Às 5h45min iniciaram-se as medidas no “modo evento” e às 7h02min o tsunami chegou.

A Figura 3 apresenta as medidas da estação DART 21413 em um intervalo de tempo mais estreito. Às 7h07min a elevação da superfície do oceano foi máxima e às 7h20min registrou-se o valor mínimo para a espessura da lâmina de água; a diferença entre o nível máximo e mínimo é cerca de 1m apenas, corroborando assim que a amplitude do tsunami em alto-mar é pequena, menor do que muitas ondas “normais” que por ali se propagam.

Como a espessura da lâmina de água  é cerca de 5825m, a equação 5 em [1] implica que a velocidade de propagação do tsunami neste local é 240m/s ou  860km/h. O intervalo de tempo que separa os valores extremos da espessura da lâmina de água (Figura 2) é 13min (780s) e neste tempo o tsunami se desloca por cerca de 190km (240m/s vezes 780s ≅ 190000m = 190 km). O deslocamento que separa estes dois pontos extremos permite estimar que o comprimento de onda do tsunami é cerca de 2x190km ou 380 km em alto-mar.

Vídeo sobre Como são detectados os tsunamis? O prof. Lang explica nesse vídeo.

“Docendo discimus.” Sêneca


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