Referenciais inerciais e não inerciais: por que a Terra pode ser tomada como um bom referencial inercial?
14 de junho, 2015 às 7:35 | Postado em Forças inerciais, Forma da Terra, Mecânica
Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/Por que podemos considerar a Terra como um bom referencial inercial e desprezar seus movimentos de rotação e translação para a análise de problemas cotidianos?
A resposta a esta pergunta é mais complexa do que aparentemente se pode imaginar.
O movimento acelerado de translação da Terra em torno do Sol (e também em torno do centro de massa do sistema Terra-Lua) QUASE não tem efeitos porque tais acelerações decorrem de forças gravitacionais devidas ao Sol e à Lua sobre o planeta e todos os corpos no planeta.
Ou seja, como tanto a Terra quanto os objetos cujo movimento nos interessa analisar estão igualmente acelerados pelo Sol ou pela Lua (ou por qualquer outro corpo massivo), no sistema de referência da Terra não é possível se observar tais acelerações ou tais forças inerciais (forças “fictícias” que acontecem em sistemas de referência não inerciais, acelerados).
No primeiro parágrafo eu usei QUASE pois existe um pequeno efeito devido ao fato de que rigorosamente o campo gravitacional do Sol ou da Lua não é uniforme sobre a Terra, originando as forças de maré.
Esta discussão já foi feita anteriormente em Por que não sentimos o movimento da Terra em relação ao Sol?
Quanto à rotação da Terra há dois efeitos perceptíveis no sistema de referência da própria Terra: a força inercial centrífuga e a força inercial de Coriolis.
A força inercial centrífuga é máxima no equador e nula nos polos da Terra. No equador ela perfaz cerca de 3 partes em mil da força gravitacional com a qual a Terra atrai um corpo e é exercida em sentido contrário ao da força gravitacional. Em outros pontos da Terra a força inercial centrífuga é menor e é exercida em uma direção diferente da força gravitacional. A força inercial centrífuga, quando somada à força gravitacional que o planeta exerce sobre um corpo resulta em uma força dirigida para baixo e que leva o nome de força PESO.
Mais detalhes sobre o peso encontras em Por que PESO não deve ser tomado como sinônimo de FORÇA GRAVITACIONAL?
Desta forma um dos dois efeitos de que a Terra está em rotação e que portanto qualquer sistema de referência na Terra é de fato não inercial fica contemplado quando usamos o peso como a força relevante para discutir a dinâmica de corpos cotidianamente. Ou seja, o efeito centrífugo, que é um efeito estritamente não inercial, já está contemplado quando consideramos a força peso. Vide também Força centrífuga.
Mas ainda resta outro efeito não inercial decorrente da rotação da Terra: a força inercial de Coriolis. Entretanto esta somente acontece para corpos em movimento em relação à Terra, crescendo sua intensidade conforme aumenta o valor da velocidade do corpo em relação à Terra. Para velocidades da ordem de m/s ou até de dezenas de m/s a máxima força inercial de Coriolis é muitas ordens de grandeza inferior a outras forças comumente envolvidas na dinâmica dos corpos que consideramos usualmente. Portanto os efeitos inerciais de Coriolis usualmente são tão pequenos que os podemos desprezar. Entretanto há efeitos que decorrem da força inercial de Coriolis e que não teriam explicação caso considerássemos que sistemas de referência na Terra são rigorosamente inerciais, sem aceleração (vide as indicações abaixo sobre a força de Coriolis).
Portanto efeitos decorrentes do fato de que sistemas de referência solidários à Terra NÃO são inerciais existem e podem ser relevantes dependendo do grau de detalhamento dos nossos modelos para os movimentos considerados. Nas situações que usualmente tratamos em sala de aula, são desprezíveis os efeitos relacionados com a translação acelerada e a rotação da Terra.
Postagens sobre a força inercial de Coriolis: Força de Coriolis.
“Docendo discimus.” (Sêneca)
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