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Questão 75 da Prova de Ciências da Natureza do ENEM 2014 (caderno amarelo)

Prof Lang,

Permita-me incomodar um pouco:a questão 75 de física (caderno amarelo) fiquei com dúvida,eu comentei a prova juntamente com alguns colegas e eu a resolvi pela 1ª lei da Termodinâmica e os outros dois profs resolveram pela equação de Clapeyron, resultado ….não deu a mesmo resultado,então me intrigou.
O sr pode me ajudar? A conclusão que eu cheguei foi contrariando a 1ª lei devidos a dados incompatíveis ou errei alguma coisa.
Desde já agradeço.

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

Abaixo está a questão 75.

gases

Um comentário inicial. A palavra HERMÉTICO não é usual no contexto da Termodinâmica. Uma consulta a qualquer dicionário (o que certamente um candidato ao ENEM não poderia fazer durante a prova!), mostra que tal palavra é polissêmica. Aliás este vocábulo está muito relacionada às pseudociências e às “ciências ocultas” como fica bem claro na consulta ao dicionário Houaiss: 1 – Relativo a Hermes Trimegisto. 2 – Relativo às ciências ocultas, especialmente à alquimia.

Assim sendo, o uso deste vocábulo em uma prova que pretende ser acessível,  pode tornar o próprio enunciado hermético segundo a quarta acepção do Houaiss: 4 – Difícil de entender; obscuro, ininteligível.

Possivelmente o idealizador da questão, que também não definiu explicitamente quem é o sistema, queira simplesmente dizer que o “sistema é fechado” (terceira acepção para hermético no Houaiss). Mas FECHADO em Termodinâmica usualmente significa que NÃO troca massa com a vizinhança, podendo trocar energia. Se o sistema é o gás, então se ele for FECHADO pode trocar calor com a chapa de aquecimento e através das paredes, além de realizar trabalho sobre o entorno devido à existência do êmbolo. Portanto, este sistema, se entendermos hermético como FECHADO, tem a possibilidade de trocas de calor com o entorno além da chapa de aquecimento.

Aplicando um critério de caridade para com a intenção do redator (idealizador da questão), afim de tentar uma solução para a questão, entenderei que as paredes do cilindro (exceto a inferior designada como chapa de aquecimento) e do êmbolo são ADIABÁTICAS, isto é, não permitem troca de calor. Aliás esta suposição é conditio sine qua non para a tentativa de solução da questão. Também assumirei que o aporte de calor no sistema seja MUITO LENTO, pois com é bem sabido, este é um pressuposto para se poder operar por exemplo, com a Equação de Clapeyron (Equação Geral de Estado de um Gás IDEAL) que somente é válida quanto o gás se encontra em equilíbrio termodinâmico, isto é, com todas as suas variáveis de estado definidas. Para maiores esclarecimentos vide  Gás ideal: quando valem as equações que conhecemos? .

Feitas todas estas suposições adicionais, e dada a condição de que a força que o êmbolo realiza sobre o gás (e portanto a força do gás realiza sobre o êmbolo) é constante, obtém-se a primeira conclusão importante: o gás se expande isobaricamente. Desta forma a informação sobre a existência de um manômetro é supérflua. Aliás é de fato supérflua no enunciado da questão pois em nenhum momento o redator explicou sua função ou seu uso nesta situação.

Se o gás se expande isobaricamente, e dado que variável delta h é diretamente proporcional às variações de volume, e que as variações de volume são diretamente proporcionais às variações de temperatura de acordo com a Equação de Clapeyron aplicada para uma transformação isobárica (Lei de Gay-Lussac), então no gráfico apresentado podemos substituir delta h por uma variação de temperatura.

A suposição de as paredes serem adiabáticas é crucial agora pois então toda a energia transferida ao gás como calor pela chapa de aquecimento é  a própria quantidade de calor efetivamente absorvida pelo gás pois não há perdas de calor para o ambiente. Se as paredes não forem adiabáticas,  não há como sabermos qual é o calor efetivamente absorvido. Notem que o enunciado da questão não explicita tal suposição e eu a uso em decorrência da aplicação do princípio da caridade para com o redator.

Finalmente, podemos então derivar do gráfico que para a mesma variação de temperatura (mesma variação em h conforme acima), o gás M absorve menos calor do que o gás V e, portanto, o gás M tem menor capacidade térmica molar (calor específico molar) do que o gás V. Aliás, estamos tratando então de inferir sobre a capacidade térmica molar a pressão constante de um gás.

Assim sendo, rigorosamente a questão é hermética (confusa) e sem solução. Mas decorrente de muita caridade para com o redator, pode-se chegar a considerar a alternativa E como correta.

OBSERVAÇÃO 1: me pouparei de comentar as “inteligentes” alternativas à alternativa “correta” (os distratores). Notarei apenas que a alternativa E é a única que usa algum termo (calor -> calorífica) utilizado no comando da questão! Portanto, dado que os distratores são todos completamente implausíveis, é fácil descobrir qual é a alternativa que o idealizador da questão pretende que seja a resposta correta.

OBSERVAÇÃO 2: o INEP poderia ser caridoso com os candidatos ao ENEM, não os obrigando a responder questões herméticas, inclusive para os seus professores de Física conforme atestam os comentários de quem recorreu ao CREF.

Vide mais sobre o ENEM 2014:

ENEM 2014 – Questão de Galileu

Questão 72 da Prova de Ciências da Natureza (caderno azul) – ENEM 2014

Novamente a questão de Termodinâmica do Enem 2014

“Docendo discimus” (Sêneca)

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