Qual a diferença entre o processo de decaimento radioativo e fissão nuclear?
7 de dezembro, 2019 às 10:26 | Postado em Estrutura da matéria, Física Nuclear, Física de Partículas, Radiação
Respondido por: Prof. Magno V. T. Machado - IF-UFRGSGostaria de saber, qual a diferença entre o processo de decaimento radioativo e fissão nuclear. Os textos dos livros didáticos de Física, em sua maioria, não fazem clara distinção entre esses dois processos. A diferença estaria basicamente no resultado dos processos? Por exemplo, no decaimento radioativo há emissão alfa, beta ou gama, de maneira que o “átomo final” não difere tanto do “átomo inicial”. Já na fissão o produto são dois átomos que possuem “massa” aproximadamente igual a metade do átomo inicial, gerando nesse processo grande quantidade de energia. E por fim, porque há mais geração de energia no processo de fissão? É devido a força de ligação? Obrigado.
A fissão foi descoberta em 1938 pelos cientistas alemães Otto Hahn, Lise Meitner e Fritz Strassmann, que bombardearam uma amostra de urânio com nêutrons na tentativa de produzir novos elementos com Z > 92. Eles observaram que elementos mais leves como o bário (Z = 56) foram formados durante a reação e perceberam que esses produtos tinham que se originar da fissão induzida por nêutrons do urânio-235. Esta hipótese foi confirmada pela detecção do produto de fissão como o elemento kriptônio-92. Na fissão, o núcleo geralmente se divide assimetricamente em vez de em duas partes iguais, e a fissão de um determinado nuclídeo não produz sempre os mesmos produtos.
Fissão espontânea é um dos modos de decaimento radioativo (além de alfa, beta, gama, captura eletrônica e conversão interna) e é típica para elementos muito pesados, i.e. grande número atômico Z e massa atômica A. O resultado da fissão é a conversão do núcleo “pai” em dois ou mais núcleos leves. Isso se dá pois a energia de ligação por nucleon, B(Z,A)/A, decresce como função do número de massa atômico A para núcleos com A > 56. Portanto, a fissão é um processo exoérgico pois o núcleo pai tem menor energia de ligação por nucleon que os seus “filhos” mais leves. A energia de ligação quantifica a estabilidade de um núcleo pois ela dá a quantidade de energia necessária para tornar os seus constituintes (prótons e nêutrons) livres e não mais mais como um estado ligado. Podemos analisar a energia liberada no processo de fissão espontânea utilizando o modelo coletivo nuclear denominado modelo de gota nuclear. Neste modelo, a energia de ligação nuclear é parametrizada em termos das características do núcleo que podem diminuir a sua energia de ligação comparado com o termo principal que é proporcional a A (denominado termo de volume). Esses são os termos de superfície, repulsão coulombiana, assimetria do número de prótons (Z) e nêutrons (N) e o termo de pareamento (se núcleos são par-par, par-ímpar ou ímpar-ímpar relativo a Z e N). Neste modelo podemos facilmente mostrar que quando núcleo pai (com Z e A) decai em 2 núcleos filho menores, a maior energia gerada será no caso onde o resultado são 2 núcleos finais com números atômico Z/2 e números de massa A/2. Ainda, a energia liberada, também conhecido como fator-Q da reação, é dada por Q = 0.37E_c-0.26E_s. As quantidades E_c = a_cZ^2A^(-1/3) e E_s = a_sA^(2/3), com a_c = 0.71 MeV e a_s=18.34 MeV, são justamente os termos coulombiano e de superfície na expressão da energia de ligação no contexto do modelo de gota nuclear. Ainda, considerando modelo da gota nuclear mas permitindo deformação nuclear, por exemplo na forma elipsoide de revolução, podemos mostrar que a fissão espontânea pode ocorrer para núcleos tais que Z^2/A > 2(a_s/a_c) = 50 (conhecida como condição de Bohr-Wheeler). Este parâmetro é um indicador geral sobre a possibilidade de um núcleo fissionar espontaneamente, e do ponto de vista experimental é satisfeito para núcleos com Z > 116 e A > 270.
Quanto à energia entregue, se compararmos fusão com fissão, a última dará mais energia por reação. Isto pode ser entendido se escrevermos o fator-Q da reação em termos das energias de ligação dos estados finais e iniciais da reação. Ou seja, Q = B(núcleo/núcleos filho) – B(núcleo pai/núcleos iniciais). No caso da fissão, estamos considerando núcleos grandes que têm uma energia de ligação por nucleon bem maior que os núcleos leves. Uma reação de fissão típica libera cerca de 200 MeV de energia enquanto que uma de fusão típica libera cerca de 18 MeV, que é menos de 10% do caso anterior. Entretanto, isto é relativo: se tivermos a mesma quantidade de combustível para fusão e fissão, a energia liberada pela fusão é maior. Por exemplo, tomemos o caso do U-235 que tem aproximadamente a massa de 235 prótons, enquanto que na fusão do dêuteron (A=2) com trítio (A=3) temos uma massa da ordem de 5 massas do próton. Ou seja, para a mesma massa de combustível teremos mais reações no caso da fusão que no caso de fissão pois teremos mais elementos leves para fundir que elementos pesados para fissionar. Assim, para massas iguais de combustível, a fusão libera mais energia.
Li certa vez que elementos radioativos podem tem meia vida de mais de 100 mil anos. Como pode um átomo liberar energia durante todo esse tempo? Duante todo esse tempo o atomo emite radiação gama? de onde vem toda essa energia, sem conversão de massa?
Não é o mesmo átomo que fica emitindo!