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Princípio da Legalidade e Mecânica quântica

No livro Epistemologia, do Mario Bunge, o autor aborda a questão do indeterminismo, expondo esta tese: “posto que os fatos físicos observáveis (que são os únicos acerca dos quais tem sentido falar) estão à mercê do experimentador, não existe legalidade objetiva. Em outras palavras, a ocorrência dos fatos físicos depende do experimentador, cujas decisões e ações não são regidas por leis físicas; portanto, os fatos físicos não são legais.”

Após, ele faz sua argumentação, mas a explicação dele ficou confusa pra mim, por que eu não sou físico. Ele argumenta que a mecânica quântica não é indeterminista, pois “não afirma que os fatos ocorrem arbitrariamente, sem regularidades”. Explica, depois, que o determinismo clássico ou o laplaciano não abarcam a mecânica quântica. A parte que mais me intrigou é a que ele fala que “o determinismo quântico tem um forte componente estocástico (que se resume na função de onda) e um forte componente causal (representado pelo hamiltoniano).” Então, o que seriam esses componentes estocástico e casual? E como e por que isso não afeta o princípio de legalidade?

BUNGE, M. Epistemologia: curso de atualização. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1980.

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

Tentarei dar uma explicação para quem, como tu, és leigo em Física. Atrevo-me a tentar explicar o que Mario Bunge quer dizer por ter lido extensamente grande parte de sua obra no final dos anos 80 e início dos 90 em função de minha tese de doutorado. Entretanto no nosso grupo de ensino do IF-UFRGS (e fora dele também) certamente tenho colegas mais competentes do que eu para tanto; espero que ao lerem minha resposta a critiquem, corrijam e complementem o que escrevo abaixo.

Quando Mario Bunge diz  “posto que os fatos físicos observáveis (que são os únicos acerca dos quais tem sentido falar) estão à mercê do experimentador, não existe legalidade objetiva. Em outras palavras, a ocorrência dos fatos físicos depende do experimentador, cujas decisões e ações não são regidas por leis físicas; portanto, os fatos físicos não são legais”, está explicitando uma interpretação positivista, subjetivista, a respeito da Mecânica Quântica (MQ) que de maneira alguma ele aceita, e que ele associa à Interpretação da Escola de Copenhague. Nota que segundo o que está posto, somente tem sentido se falar em OBSERVÁVEIS (este é um dos preceitos do positivismo) e que estes dependem de um experimentador ou OBSERVADOR (daí o subjetivismo).

Para Bunge a MQ é uma teoria determinista e probabilista (estocástica). O probabilismo quântico (que ele evita de denominar como indeterminismo) está posto em que a função de onda (mais especificamente o quadrado da função de onda) está a associada à (densidade de) probabilidade de um ente quântico estar em uma particular região do espaço. Portanto a função de onda não leva a previsões pontuais sobre os entes quânticos como por exemplo fazia a Mecânica Newtoniana para os objetos em geral (determinismo laplaciano), conduzindo a previsões probabilistas.

Apesar de então haver um caráter probabilista na MQ, a própria função de onda (de onde se calculam as probabilidades) para um objeto quântico (por exemplo um elétron) satisfaz uma equação diferencial, na qual é crucial o potencial de interação do objeto com o seu entorno (por exemplo o potencial eletrostático determinado pelo núcleo com o qual o elétron interage em um átomo). Desta forma as probabilidades quânticas são DETERMINADAS, são LEGAIS (obedecem leis), são causalmente determinadas.

“Docendo discimus.” (Sêneca)

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Comentário no Facebook em 01/11/2017

Prof. Emmanuel Marcel Favre-Nicolin – A pergunta feita foi “Então, o que seriam esses componentes estocástico e casual?” ou Então, o que seriam esses componentes estocástico e causal?”. A segunda opção parece fazer mais sentido. Se o aspecto causal se entende através da compreensão da equação diferencial que tem caraterística de ser causal, o aspecto casual seria encontrado no problema da medição em mecânica quântica ou do COLAPSO da função de onda. De todo modo, só vi aqui falar aqui do assunto interessante proposto que me fez acordar e acabou me levando a começar a leitura de dois artigos interessantes! O primeiro de Olival Freire sobre o problema da medida (http://www.fflch.usp.br/df/opessoa/Prob-Med-1.pdf) e o artigo de Michel Paty sobre o determinismo e seus limites (www.scielo.br/pdf/ss/v2n4/a01v2n4.pdf). Cabe talvez entender bem o que são CAUSALIDADE e DETERMINISMO para discutir o tema proposto, coisas abordada pelo artigo de Michel Paty!
Comecei bem o dia pois isto é muito interessante para o tema matemática na história da física que propus como projeto na disciplina de história da física e como tema pessoal “ALEATÓRIO” de pesquisa exploratória , enfim quero dizer não totalmente aleatório pois há CONTINGÊNCIAS nessa escolha. Não acredito em algum tipo de DETERMINISMO nisso mas porém não foi totalmente FORTUITO. Em outros termos, não acredito que haveria FATALIDADE nessa escolha minha.

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