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Outra vez a refração atmosférica na mitológica Terra Plana e no mundo real!

Professor Lang

Tenho acompanhado a nova concepção de atmosfera (ou como eles gostam, atmosplana kkkkk) dos terraplanistas na tentativa de de justificarem o injustificável: de que o Sol, apesar de permanecer sempre acima do plano da TP, baixaria por refração atmosplânica (risos). Recentemente M…. e R…..  justificam o efeito através da “atmosplana invertida”, isto é, de que a densidade do ar aumentaria conforme a altitude aumenta. Não está esclarecido por eles até qual altitude este doido crescimento da densidade do ar vai.

Acho que o professor poderia fazer uma postagem sobre o tema, aproveitando para nos ensinar um pouco de Física a partir da bobagem dos terrachatos. Gostaria que o sr. demonstrasse o efeito de elevação do Sol (e dos astros em geral) próximo ao horizonte e o efeito de achatamento do diâmetro vertical do Sol. Agradeço antecipadamente.

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

Vou fazer a demonstração pedida em um modelo muito simples:

1 – Uma Terra plana, 2 – com atmosfera (ou seria atmosplana? 🙂 ) com índice de refração uniforme, independente da altitude com o valor de 1,0003 (índice de refração do ar a 1 atm), 3 – com o Sol acima da atmosfera.

A demonstração pode ser acompanhada por quem tenha apenas ensino médio e talvez até por algum terra-chato (será que sou muito otimista? 😉 ). Para uma abordagem mais realista vide Flatness of the setting Sun.

A Figura 1 representa (fora de escala) a luz do Sol chegando à superfície de separação do ar (azul) com o vácuo (preto) segundo um ângulo de apenas 3° com esta superfície (ou 87° com a normal à superfície). Segundo a Lei de Snell – que neste caso é expressa como

1.sen(87°)=1,0003.sen(β),   (1)

onde β é o ângulo de refração – o ângulo de refração vale 86,7°. Portanto a luz chega ao olho do observador de uma direção elevada 0,3° com a direção original do Sol. Ou seja, a posição do Sol aparente é 0,3° acima da sua posição real.

Há muito tempo se sabe que o Sol aparente no horizonte se encontra cerca de 0,5° acima do Sol real. Como o tamanho angular do Sol é muito aproximadamente 0,5°, quando o vemos tocando o horizonte de fato ele já se encontra totalmente abaixo do horizonte. Este é o efeito da refração atmosférica que sempre eleva um pouco a posição do Sol aparente em relação à posição real.

No modelo simplificado da Figura 1 é fácil demonstrar que baixando mais o Sol, a diferença entre a posição real e observada cresce, atingindo 0,5° quando sua elevação é apenas 1,7° com a (ou 88,3° com a normal)  superfície que separa a atmosfera do vácuo.

Pode-se agora demonstrar que o Sol aparente próximo ao horizonte se apresenta com o seu diâmetro vertical achatado em relação ao diâmetro horizontal  e este continua valendo 0,5°. A demonstração é feita por se calcular uma nova direção aparente do Sol, imaginando que o ângulo de 3° na Figura1 se reduza exatamente pelo tamanho angular do Sol  que é 0,5°. Portanto o ângulo com a direção da superfície de separação do ar com o vácuo é tomado como 2,5° e o ângulo com a normal à superfície de separação do ar com o vácuo vale portanto 87,5°. Utilizando-se novamente a Lei de Snell, agora sendo expressa como

1.sen(87,5°)=1,0003.sen(β),   (2)

resulta em β=87,1°. Ou seja, a direção do Sol aparente mudou de 86,7° para 87,1°, isto é, diminuiu, se aproximou da horoizontal, 0,4° enquanto a diferença real é 0,5°. Desta forma o observador notará que o diâmetro vertical do Sol (0,4°) é menor do que o seu diâmetro horizontal (0,5°).

O mesmo modelo pode ser usado para predizer os efeitos de refração com a estapafúrdia “atmosfera invertida”.  Como, segundo a presunção de “atmosfera invertida”, a densidade aumenta ao se subir por ela, pode-se modelar colocando no lugar do vácuo um meio com índice de refração maior do que o do ar na pressão de 1atm. Suponhamos que ele valha 1,0006 e refaçamos todos os cálculos começando por

1,0006.sen(87°)=1,0003.sen(β),   (3)

onde β é o ângulo de refração – o ângulo de refração vale 87,3°. Portanto a luz chega ao olho do observador de uma direção 0,3° abaixo da direção original do Sol. Ou seja, a posição do Sol aparente está 0,3° abaixo da sua posição real como desejam os terra-chatos.

Vejamos agora qual é o efeito sobre o diâmetro vertical do Sol. Para tanto calculemos o ângulo de refração que corresponde a um ângulo 2,5° com superfície de separação dos dois meios ou 87,5° com a normal à superfície de separação usando mais uma vez a Lei de Snell:

1,0006.sen(87,5°)=1,0003.sen(β),   (3)

resulta em β=87,9°. Ou seja, a direção do Sol aparente mudou de 87,3° para 87,9°, isto é, aumentou 0,6° enquanto a diferença real é 0,5°. Desta forma o observador notaria, caso a estapafúrdia “atmosfera invertida” fosse concretizada,  que o diâmetro vertical do Sol (0,6°) é maior do que o seu diâmetro real (0,5°). Ou seja, se na mitológica Terra Plana o Sol baixar por refração, notar-se-á em contradição com os fatos, um alongamento do diâmetro vertical do Sol em relação ao diâmetro horizontal.

Conforme já havia sido notado na postagem de 2018 (Refração atmosférica e o Sol na mitológica Terra Plana e no mundo real):

O achatamento do Sol junto ao horizonte por si só constitui-se em uma importante evidência de que a refração atmosférica determina que as posições aparentes das coisas vistas no céu estão elevadas em relação às suas posições reais. Caso a refração operasse em acordo com a proposição dos terra-chatos, i.e. diminuindo a elevação das coisas observadas no céu, o achatamento do Sol junto ao horizonte seria no sentido de alongar o diâmetro vertical em relação ao horizontal. Ou seja, o Sol se apresentaria achatado no eixo horizontal quando de fato ele se apresenta achatado no eixo vertical conforme a foto na Figura 4 evidencia. 

Desta forma a observação do Sol no céu do mundo real refuta de muitas maneiras a esdrúxula, anacrônica e fideísta Terra Plana.

Para maiores informações sobre a refração atmosférica e o formato do Sol próximo ao horizonte vide  Sol achatado junto do horizonte,   Achatamento aparente do Sol e Formato do Sol.

Para uma discussão da refração atmosférica no mundo real vide: A refração atmosférica e os seus problemas nas observações astronômicas.

Vide outras refutações em

O equinócio na Terra Plana e no mundo real.

O solstício de verão na Terra Plana e no mundo real!

“Docendo discimus.” (Sêneca)


2 comentários em “Outra vez a refração atmosférica na mitológica Terra Plana e no mundo real!

  1. Discussão interessante e, aparentemente, pode ter alguma utilidade na questão do formato do mundo. Podemos sair do campo teórico e das ofensas e refazer o experimento do ET Bilu. Alega-se que esse experimento foi de certo modo fraudado.

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