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O átomo de Kelvin

Ao se estudar os modelos atômicos nenhuma referência é feita ao modelo de Kelvin. Este modelo foi completamente superado?

Respondido por: Prof. Fernando Kokubun (FURG) - https://www.fisicaseteemeia.com.br/2021/

Nos cursos de física somos apresentados aos modelos atômicos de J.J. Thomson, E. Rutherford, N. Bohr e E. Schroedinger e talvez ao modelo saturniano de H. Nagaoka [1]. Nada nos é ensinado sobre o átomo de vórtex de Kelvin, inspirado nos trabalhos desenvolvidos por Herman von Helmholtz em fluídos, um modelo contínuo da matéria.

O modelo do vórtex atômico foi apresentado por Wiliam Thomson (Lord Kelvin) em 1867 [2]. Neste artigo, W.Thomson escreve “Após notar a admirável descoberta de Helmholtz sobre a lei do movimento de vórtex em um líquido perfeito (…)  inevitavelmente sugere a ideia de que os anéis de Helmholtz são os únicos átomos verdadeiros”, fazendo uma crítica da ideia de um átomo rígido e impenetrável (no original “the monstrous assumption of infinitely strong and infinitely rigid pieces of matter”). Neste modelo, os vórtex apesar de fluídos, possuem oscilações e suas formas de vórtex são mantidas intactas (em um espaço desprovido de processos dissipativos) apesar das colisões entre eles. Esta propriedade de colidir poderia – de acordo com Thomson –  ser explorada no estudo da termodinâmica de gases.

Uma outra aplicação seria no estudo da espectroscopia, citando em particular o espectro do sódio, de que seja “provável que o átomo de sódio não consista em uma única linha de vórtice; mas pode muito provavelmente consistir em dois anéis de vórtice aproximadamente iguais passando um pelo outro, como dois elos de uma corrente.”  (No original: It seems, therefore, probable that the sodium atom may not consist of a single  vortex line; but it may very probably consist of two approximately  equal vortex rings passing through one another, like two links of a chain. )

A figura 2 ilustra esta construção (retirado do artigo Knot Theory’s Odd Origins, D. Silver, publicado na American Scientist, janeiro de 2006 que  pode ser acessado aqui).

Os diferentes tipos de átomos seriam constituídos por vórtex com nós. Como os átomos persistem com o tempo, o fluído que formaria os vórtex teria que ser um fluído perfeito, excluindo portanto qualquer fluído conhecido. Com o advento do Eletromagnetismo alguns autores associaram os vórtex com as oscilações do Aether, o fluido que permearia todo o Universo.

Peter Tait, contemporâneo e amigo de Thomson, inicialmente cético a respeito do modelo de vórtex, dedicou-se a estudar e tentar uma classificação sistemática com todos os possíveis tipos de nós, acreditando as propriedades dos nós levaria ao entendimento da tabela periódica dos elementos, apresentada pela primeira vez por D. Mendeleev em 1869. O laço sem nó seria o átomo de hidrogênio e os diferentes tipos de nós não equivalentes seriam os outros elementos da tabela periódica.

Apesar do entusiasmo de Kelvin e talvez mais de Tati, este modelo acabou sendo rapidamente abandonado. Entretanto originou uma área importante da matemática, a Teoria dos Nós.

E nos últimos anos a ideia de aplicar a teoria dos nós na física retornou, embora de forma distinta daquela imaginada por Kelvin.  Assim, apesar do seu insucesso como modelo atômico, a atual proposta de utilizar a teoria de nós em sistemas quânticos é muito promissora (ver por exemplo o texto sobre o Chip Majorana 1 no blog ou no site do CREF ). Assim sendo, a teoria do vórtex atômico de Kelvin pode ser considerada como uma “Bela Perdedora” [3]!

Notas

[1] Nagaoka, H. (1904). LV. Kinetics of a system of particles illustrating the line and the band spectrum and the phenomena of radioactivity . The London, Edinburgh, and Dublin Philosophical Magazine and Journal of Science, 7(41), 445–455. https://doi.org/10.1080/14786440409463141 . No excelente  livro Física Moderna – Origens clássicas e fundamentos quânticos de Francisco Oguri eVitor Oguri, LTC, 2ed, 2016, existe um trecho que apresenta brevemente o Modelo de Nagaoka.

[2]  On Vortex Atoms. Thomson W. 4. Proceedings of the Royal Society of Edinburgh. 6:94-105 (1869). doi:10.1017/S0370164600045430. Uma cópia pode ser acessada aqui .  Este artigo The Vortex Atom: A Victorian Theory of Everything Kragh, Helge . Centaurus 44 (1-2):32-114 (2002) apresenta um panorama histórico do modelo do Vórtex Atômico.

[3 ] Beautiful Losers: Kelvin’s Vortex Atoms, Frank Wilczek , 29 de dezembro de  2011

 


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