Gravitação: gráviton e fóton
28 de janeiro, 2018 às 17:22 | Postado em Cosmologia, Eletromagnetismo, Gravitação, Interações fundamentais, Ondas eletromagnéticas
Respondido por: Prof. Michel Elile Marcel Betz - IF-UFRGSConsiderando que (1) o fóton não tem massa; (2) é um mediador de interações eletromagnéticas; (3) a gravidade é resultado da mediação do gráviton na interação entre corpos massivos:
a) como explicar o fato de a luz alterar sua trajetória na presença de uma estrela ou de um cluster?
b) os mediadores, fóton e gráviton interagem entre si?
A pergunta está muito bem formulada e bastante pertinente. Embora o enfoque esteja principalmente nas partículas mediadoras das interações, ou seja, na visão quântica, vale a pena começar revisando brevemente alguns aspectos das teorias clássicas da gravitação.
Na teoria da gravitação de Newton, a aceleração de um corpúsculo num campo gravitacional é independente da massa do corpo. Isto porque a massa do corpúsculo está presente como fator de cada lado da equação que expressa a lei fundamental da dinâmica de Newton: do lado esquerdo, multiplicando a aceleração, e do lado direito na expressão da força gravitacional, que é proporcional ao produto das massas envolvidas. Assim, um corpúsculo de massa arbitrariamente pequena sofre aceleração e é desviado pela presença de corpos massivos, fontes de um campo gravitacional. No século XVIII, quando a interpretação corpuscular da luz era geralmente aceita, vários trabalhos de pesquisa foram dedicados ao estudo deste efeito. Naturalmente, sendo a velocidade da luz muito grande, os desvios previstos eram pequenos e difíceis de observar.
Na segunda década do século XX, Einstein propôs uma visão profundamente diferente da gravitação, mas ainda baseada em conceitos clássicos (em oposição a quânticos), conhecida como Relatividade Geral. Nesta teoria, a gravidade passa a ser interpretada como uma modificação da geometria do espaço-tempo devida à presença de matéria e campos. Na equação fundamental da Relatividade Geral, está presente de um lado um objeto matemático, tecnicamente, um tensor de segunda ordem, que representa as densidades e os fluxos de energia e momento linear existentes num dado ponto do espaço-tempo. Naturalmente, as massas presentes contribuem, através da famosa relação massa-energia de Einstein, para este tensor de energia-momento, mas vale ressaltar que campos eletromagnéticos, por exemplo, também contribuem. Do outro lado da equação está presente outro objeto matemático, também um tensor de segunda ordem, conhecido como tensor métrico, que representa a geometria do espaço-tempo. O espaço-tempo, que seria plano na ausência de partículas e campos, fica curvado pela presença dessas entidades.
Como a gravitação determina a geometria do espaço-tempo, ela influencia o movimento de todas as partículas. Na Relatividade Geral, entende-se por “partícula livre” uma partícula submetida apenas à gravidade. Tal partícula percorre no espaço-tempo uma curva de um tipo particular, conhecida como geodésica. A menos que sofra uma interação com alguma outra partícula, um fóton também se move sobre uma geodésica. Ao longo de uma geodésica, é possível definir um intervalo entre pontos que, no caso de uma partícula massiva, possui a interpretação de intervalo de tempo próprio da partícula. No caso de uma partícula sem massa, como o fóton, este intervalo é nulo, justificando a expressão geodésica nula usada para caracterizar uma geodésica percorrida por um fóton. Vale notar que tem-se aqui a formalização mais precisa da afirmação intuitiva, atribuída a Einstein, de que, para quem conseguisse acompanhar um raio de luz, o tempo pararia. Resolvendo as equações da Relatividade Geral, pode-se determinar as geodésicas nulas no campo gravitacional produzido pelo Sol e daí calcular o desvio de raios de luz oriundos das estrelas e passando perto do Sol. A comparação dos resultados de tais cálculos com dados obtidos na ocasião do eclipse solar de 1919, em especial no Brasil na cidade de Sobral, constitui-se num dos primeiros testes importantes da Relatividade Geral.
A respeito da quantização da gravitação, não é possível fazer afirmações contundentes, pois não há, no momento, uma teoria gravitacional quântica aceita como paradigma. O procedimento padrão de quantização canônica, que consistiria em elevar o tensor métrico ao nível de operador satisfazendo determinadas relações de comutação, não tem êxito, devido ao surgimento de grandezas infinitas que não podem ser eliminadas pelo procedimento usual de renormalização. Numerosas propostas mais exóticas que procuram geralmente englobar todas as interações numa única teoria podem ser encontradas na literatura. Talvez o único aspecto comum a todas seja a existência de uma partícula mediadora da gravitação, de massa nula e spin 2, o gráviton.
Não seria possível fazer aqui uma revisão deste amplo e muito ativo campo de pesquisa mas, já que a pergunta indaga sobre possíveis interações entre fóton e gráviton, vale mencionar uma classe particular de teorias que sugerem que grávitons poderiam ser observados nos mais potentes aceleradores já disponíveis, ou em aceleradores possíveis de serem construídos nas próximas décadas. Trata-se de teorias que postulam a existência de dimensões adicionais do espaço-tempo, além das 4 dimensões comumente observadas, uma linha de pesquisa teórica iniciada pelo matemático alemão Theodor Kaluza e pouco depois também adotada pelo físico sueco Oskar Klein. Essas dimensões extra seriam “compactificadas” e poderiam ser observadas apenas em experimentos com grande resolução espaço-temporal o que, pelas relações de indeterminação de Heisenberg, requer valores altos de energia e momento linear. A noção de compactificação pode ser entendida considerando um espaço constituído de uma superfície cilíndrica de comprimento infinito mas raio muito pequeno. Apenas experimentos de alta resolução poderiam distinguir tal espaço (bidimensional) de uma simples linha reta (unidimensional). Muitas teorias postulam que a escala na qual as dimensões compactificadas poderiam ser observadas e na qual a gravitação possuiria intensidade comparável com as demais interações é a escala de Planck, da ordem de 10-35 m, o que corresponde a energias da ordem de 1016 TeV , muito além do alcance de aceleradores atuais ou futuros. Mas certas propostas especulam que as dimensões compactificadas poderiam ter tamanho da ordem da escala na qual ocorre a unificação das interações eletromagnéticas com as fracas, 10-19 m ou 1 TeV, energia já alcançada (e ultrapassada) pelo LHC (Large Hadron Colllider), o maior acelerador de partículas da atualidade, localizado em Geneva. Sendo assim, a produção de grávitons poderia ocorrer, com probabilidade significativa, neste acelerador. Um evento, entre outros, que poderia resultar na produção de um gráviton seria a fusão de dois fótons. Assim, houve nos últimos tempos uma procura intensa por tais eventos embora, até este momento, nenhum processo que poderia ser plausivelmente interpretado como manifestação da existência de dimensões extra foi identificado experimentalmente.
Muito interessante, só faltou responder a pergunta!
O que faz o foton ter a trajetória curva é a curvatura do espaço-tempo, e não o que seria a interação gravitacional entre o foton e o graviton
https://youtu.be/XUg3Pjny4no
Eletromagnetismo pode curvar a luz? Esse experimento acima é válido?
O experimento do vídeo absolutamente nada tem a ver com o encurvamento da luz por um campo magnético. O que se está vendo é o encurvamento de um feixe de elétrons no célebre experimento de Thomson do final do século XIX.
Há anos eu comentei no vídeo indicado mas o meu comentário foi suprimido.