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Frenagem em meio líquido: a imersão do saltador parece quase não depender da altura de queda!

Atuo como professor de Educação Física e pratico canionismo. A minha pergunta busca o esclarecimento sobre as razões de uma variação tão pequena na relação altura do salto e profundidade de imersão do saltador. Entre um salto de 3 metros e um salto de 10 metros parece-me, pela experiência que a diferença de emersão não passa de 1 metro na água. Presumo que a força de arrasto aumente em proporção maior que o aumento da altura do salto. Ou seja, embora a velocidade de entrada da água seja o dobro, essa proporção parece não se repetir na profundidade de imersão. Gostaria se pudesse fazer um comentário sobre isso. Desde já agradeço pelo seu retorno.

 

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

A força de arrasto (ou de resistência) que a água oferece a um corpo que se move através dela é proporcional ao quadrado da velocidade do corpo em relação à agua. Indico aqui três referências a artigos de minha autoria que tratam da força de arrasto (no ar e na água) e desta dependência com a velocidade: 1 – A frenagem de um projétil em um meio fluido,  2 – A física no salto recorde de Felix Baumgartner e 3- Potência de tração de um veículo automotor que se movimenta com velocidade constante.

A velocidade que o saltador adquire quando se precipita até atingir a água aumenta com a altura da queda. Segundo a bem conhecida “Equação de Torricelli” o quadrado da velocidade (V) no final da queda cresce linearmente com altura de queda (H):  V2=2gH onde g é aceleração da gravidade.

Assim a força de arrasto inicial (isto é, quando o saltador toca a água) cresce proporcionalmente à altura de queda. A  aceleração de frenagem que o saltador sofre é tanto maior quanto maior é a altura de queda, explicando assim a  intuição baseada nas tuas experiências.

O modelo quantitativo que desenvolvi no primeiro artigo supracitado pode ser aplicado ao saltador pois ele se torna um “projétil humano” sendo freado pela água; entretanto tal modelo desconsidera quaisquer outras forças de frenagem além da força da arrasto. Utilizei-o para fazer uma estimativa da imersão do Laso Schaller em seu salto espetacular de 59 m de altura – Salto recorde de Laso Schaller na cachoeira e força de impacto na água – que resultou em uma imersão de cerca de 4 m a contar dos pés ou de cerca de não mais de 2,5 m do topo de sua cabeça. Esta estimativa deve superestimar extensão da imersão por desconsiderar o empuxo hidrostático.

Demonstrei no artigo 1 que a redução percentual (fator de atenuação na seção IV do artigo) do quadrado da velocidade (melhor, da energia cinética do projétil na água) é independente da energia cinética inicial e tal decorre diretamente do fato que a força de arrasto cresce com o quadrado da velocidade. O decaimento da velocidade ou da energia cinética é exponencial com a distância percorrida através do fluido.

Então a tua intuição tem suporte teórico pois o estancamento do “projétil humano” é quase independente  da altura do salto. Isso pode ter uma consequência terrível para saltadores de grande altura (intuitiva também): a força de arrasto pode produzir lesões sérias no saltador.

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Um comentário em “Frenagem em meio líquido: a imersão do saltador parece quase não depender da altura de queda!

  1. Carlos Roberto Alcântara de Rezende disse:

    Agradeço a sua atenção e a resposta esclarecedora. Esteja certo que será útil para mim e para os praticantes de canionismo que tiverem acesso.

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