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Interpretação da Escola de Copenhague na URSS

Postagem de Fernando Lang da Silveira  na comunidade do Facebook MPEF UFRJ  em 20/03/2014:

Na URSS da década de 30 e 40 a “interpretação da Escola Copenhague” não era tolerada por suas notórias vinculações filosóficas com o idealismo subjetivo (positivismo), incompatível com a filosofia materialista dialética. Vladimir Fock, receptivo às ideias da EC, a apresentava na linguagem tolerada pelo partido, consistente com o marxismo-leninismo (fez igual trabalho em relação à Teoria da Relatividade que também sofreu restrições do partido). Bohr foi impedido de visitar a URSS diversas vezes por professar uma filosofia incompatível com o materialismo dialético mas finalmente nos anos 50 esteve por lá.

A propósito transcrevo parte do verbete sobre Bohr no “Diccionario de Filosofia” do Editorial Progresso editado em 1984 na URSS:

“Nos últimos anos de sua vida, superando a influência do positivismo, Bohr se aproximou da interpretação materialista e dialética de uma série de problemas da mecânica quântica e da teoria do conhecimento. O processo de aproximação entre a ciência e a política conduziu Bohr a compreensão de que o cientista atomista deve ser tanto físico como político e tomar consciência da responsabilidade vinculada com o progresso do saber.”

Vale lembrar que o embate entre materialismo e idealismo (positivismo machiano do final do século XIX) no âmbito das ideias científicas levou Lênine em 1908 no exílio a escrever sua obra de filosofia da ciência “Materialismo e empiriocriticismo”. O empiriocriticismo era a filosofia machiana (de Ernst Mach). Lênine ao longo de todo este livro com mais de 300 páginas refuta o empiriocriticismo e denuncia a total incompatibilidade desta filosofia com o materialismo dialético.

Ora, a Escola de Copenhague professou posteriormente ideias consistentes com o positivismo machiano e daí a intolerância na URSS às concepções de Bohr e outros.

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

Discussão na comunidade do Facebook MPEF UFRJ a partir da postagem de Fernando Lang da Silveira em 20/03/2014:

Alexandre C Tort (UFRJ) – Acho que Fock falava em “potencialidades”. A medida concretizava a potencialidade. Muitas discussões sobre a interpretação da MQ… Eu me perguntava: como é possível distinguir uma interpretação de outra experimentalmente? Ingenuidade…

Alexandre Medeiros (UFRPe) – Era perigoso divergir da estreita interpretação da ciência oficial. Muitos que se arriscaram, não tiveram um destino muito bom. O FOCK já tinha a sonoridade de seu nome apropriada para esperar um possível castigo. Rsrsrs …

Fernando Lang da Silveira (UFRGS) – A tua pergunta, Alexandre C Tort, já denota uma preocupação positivista! 🙂
Mas mesmo que as duas interpretações não (??) sejam distinguíveis experimentalmente, elas podem ter implicações diversas, fomentando inclusive programas de pesquisa diferentes. O programa de pesquisa das variáveis ocultas esteve comprometido com uma concepção realista, materialista. Não é por acaso que o materialista dialético David Bohm (acusado de comunista pelo macartismo) vai desenvolver uma teoria de variáveis ocultas inspirada no realismo de Einstein e De Broglie.

Alexandre C Tort – O teorema de Bell e os experimentos modernos possibilitaram o descarte experimental das teorias de variáveis ocultas. Na época, isso não era possível.

Fernando Lang da Silveira – Descarte experimental das teorias de variáveis ocultas LOCAIS, não é?

Alexandre C Tort – Yep! Ainda sobrevivem outras possibilidades…

Fernando Lang da Silveira – O REALISMO é IMORTAL!! Assim como o IDEALISMO!!

Alexandre C Tort – Versões do embate materialismo aristotélico X idealismo platônico?

Fernando Lang da Silveira – O idealismo platônico é OBJETIVO. As ideias tem existência independente das mentes. O idealismo machiano (positivista) está dentro da corrente IDEALISTA SUBJETIVA. Aliás esta corrente idealista subjetiva abriga muitas concepções diversas. O próprio POSITIVISMO teve a pretensão de ser uma terceira via entre IDEALISMO e REALISMO (materialismo). Na obra supracitada do Lênine ele demonstra que o positivismo (empiriocriticismo) não é a terceira via, sendo insustentável ser marxista e machista ao mesmo tempo como queriam alguns pensadores russos seus contemporâneos.

Fernando Lang da Silveira – Acho que o importante é notar que estas filosofias diversas tem implicações em termos do fazer dos físicos que muitas vezes não são reconhecidas e outras tantas vezes são negadas e ditas irrelevantes.

Alexandre C Tort – A pretensão de fazer teoria de forma absolutamente objetiva, livre de vieses, incolor, inodora, “neutra” é só uma … pretensão. Basta examinar de perto o desenvolvimento das idéias de um teórico para comprovar. Somos prisioneiros da história e da cultura da sociedade na qual nascemos. Que consigamos, por linhas tortas, descobrir, fazer modelos que funcionam, para mim é um mistério.

Fernando Lang da Silveira – Machista na minha resposta acima é o mesmo que machiano. Pois marxistas “machistas” de fato podem existir e eu mesmo conheço um!!  🙂

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