Conservação da energia na aniquilação do par pósitron-elétron
26 de setembro, 2013 às 7:49 | Postado em Eletromagnetismo, Mecânica quântica
Respondido por: Prof. Luiz Fernando ZiebellAproveito [novamente] o perpétuo tema dos motos-perpétuos para lhe perguntar um outro detalhe.
Um tal de Clauss Turtur (aquele do doc de 125 páginas do motor eletrostático) alega poder tirar energia usando a propagação dum campo: magnético/elétrico/gravitacional. Por milagre, ele escolheu o elétrico, triste esquecido dos alegadores de free-energy.
Suas afirmações partem do pressuposto de que, por um campo propagar-se com velocidade finita (c=300.000 km/s), a carga que o “gera” na verdade está como que expelindo energia constantemente. Evidente que essa interpretação é errada, pelo simples fato que o universo “explodiria” de tanta energia. Mas minha pergunta é a seguinte: num sistema dinâmico em que uma carga “surge”(digamos, um fóton gama gerando um par pósitron-elétron, ou coisa que o valha), como se estabelece a energia, no decorrer do tempo, associada ao campo que vai se propagando pelo espaço em velocidade c.
Eu imagino um campo como uma região de iteração, mas como campo também envolve energia, não sei ao certo como pensar dinamicamente este processo. O processo acima certamente envolve magnetismo, em função de dE/dt ser diferente de zero.
Não sei se consegui me exprimir claramente, mas qualquer coisa, posso refazer a questão. Enfim, acho que se pode perguntar: de onde vem a energia associada a um campo elétrico que não existia e passa a existir? Eu imagino que o “não existia” é que guarda o segredo, mas me falta detalhes nesse passo, pois envolve o trabalho de separação das cargas entre outras coisas.
Um abraço e novamente obrigado pelo conhecimento!
Giuliano
A pergunta é bastante interessante. Vamos tentar uma resposta em poucas palavras:
Em primeiro lugar, do ponto de vista da Teoria Eletromagnética clássica, não é correto dizer que “o campo se propaga com a velocidade da luz”. O que se propaga é uma perturbação no campo, ou seja, uma onda eletromagnética. Havendo uma distribuição estacionária de cargas, o campo produzido é estacionário também e não está “se propagando”.
Quanto à questão do campo que “não existia e passa a existir”, vamos olhar o processo inverso, do campo existente que deixa de existir. Me parece mais simples de expor o argumento nesse caso.
Consideremos então um elétron e um pósitron, a uma certa distância um do outro. No sistema constituído por estas duas partículas dotadas de carga elétrica existe uma energia potencial elétrica. Podemos considerar que esta energia está acumulada no campo elétrico que existe no entorno das partículas.
Se as partículas forem liberadas, a partir do repouso, serão aceleradas uma em direção à outra (cargas opostas se atraem). Enquanto se aproximam, parte da energia potencial inicialmente acumulada vai se transformando em cinética. Parte, porque cabe notar que o campo no entorno das partículas vai se alterando enquanto elas se movem. Essa perturbação do campo propaga-se, com a velocidade da luz. Ou seja, o sistema de partículas aceleradas irradia parte de sua energia na forma de radiação eletromagnética. No instante antes da colisão, quando as partículas tendem ao mesmo ponto do espaço, podemos dizer que a energia potencial inicialmente acumulada no campo transformou-se em energia cinética e em energia eletromagnética irradiada.
Como se trata de partícula e anti-partícula, quando colidem ocorre o processo chamado de “aniquilação”. Toda a energia associada às partículas colidentes é transformada em radiação, havendo desaparecimento da massa. A carga também desaparece (basta somar a carga do elétron com a do pósitron, o que dá carga nula). Cabe notar que a energia das partículas colidentes é a soma da energia associada às “massas de repouso” do elétron e do pósitron, mais a energia cinética que eles tinham ao colidirem.
Em tempo (após o comentário do Prof. Alexandre C. Tort abaixo): A descrição adequada do processo de aniquilação, assim como do processo inverso, de criação de pares de partículas, não pode ser feita no âmbito da Teoria Eletromagnética Clássica. Para isso, deve ser usada a Eletrodinâmica Quântica. Mas de qualquer forma é respeitada a conservação de energia, assim como é respeitada no argumento simplificado apresentado acima, a respeito da aproximação do par de partículas e do “desaparecimento” do campo associado a elas.
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Alexandre C Tort – O decaimento de um fóton em um par elétron-posítron é um processo que só pode ser descrito pela EDQ. Você precisa desenhar os diagramas de Feynman relevantes, calcular as amplitudes de probabilidade com as regras de Feynman, somar essas amplitudes e calcular o seu módulo ao quadrado. Depois calcula- se a seção de choque ou probabilidade de que o evento aconteça. O “campo” em TQC não tem a interpretação clássica usual.
Alexandre C Tort – Isto posto, pode-se olhar o processo da criação de pares a partir de um fóton como um exercício sobre as leis de conservação de energia e momento linear relativísticas. Nesse caso descobriremos que tal processo só pode acontecer na presença de um núcleo (ou buraco negro! Radiação Hawking! ), pois caso contrário as leis serão violadas. De qualquer modo, o fóton é tratado como partícula, o quantum do campo eletromagnético quantizado.
Alexandre C Tort – Em tempo: por que razão um fóton cria um par partícula-antipartícula? Não sabemos, só sabemos calcular a probabilidade (seção de choque) para que isto aconteça.
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