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Radiação de partículas carregadas

Se uma partícula carregada que esteja em movimento produz radiação eletromagnética, por que o feixe de elétrons (ou os raios catódicos) em uma ampola de Crookes já não é naturalmente “colorido”, sendo necessária a colisão com o vidro para a emissão de luz? Ainda no contexto da pergunta, acrescento outro exemplo em que ela se aplica: num fio condutor de cobre, por exemplo, por qual motivo não se enxerga luz quando uma corrente percorre o mesmo?!

Respondido por: Prof. Luiz Fernando Ziebell - IFUFRGS

O primeiro ponto a levar em consideração é que não é precisa a afirmação feita na pergunta, que “uma partícula carregada que esteja em movimento produz radiação eletromagnética”. O que ocorre, e pode ser demonstrado usando a Teoria Eletromagnética, é que uma partícula carregada que está acelerada produz radiação eletromagnética. Não é o movimento, e sim a aceleração que está associada à produção de radiação eletromagnética.

As características da radiação produzida (intensidade, faixa de frequência, direção, etc.) dependem de características do movimento acelerado da partícula emissora, como a magnitude da aceleração e sua direção com relação à direção da velocidade. No caso de um elétron acelerado em movimento retilíneo, a Teoria Eletromagnética prevê (e as observações confirmam) que para que seja irradiada uma potência igual à potência que é fornecida pela fonte externa que causa a aceleração, o elétron precisaria ganhar energia a uma razão de aproximadamente 30 J/m. Em um tubo com cerca de 0,5 m de comprimento e diferença de potencial de 10.000 V, por exemplo, o campo elétrico entre as placas é de 20.000 V/m, e um elétron adquire uma energia dada por (1,6×10-19 C)(10.000 V)= 1,6×10-15 J, correspondendo a 3,2×10-15 J/m, um valor muitíssimo menor do que 30 J/m. Ou seja, o elétron acelerado irradia, mas apenas uma fração desprezível de sua energia.

Mesmo nos mais poderosos aceleradores lineares disponíveis hoje em dia, a aceleração é ainda uma fração da que levaria à emissão de uma potência igual à potência recebida. Em aceleradores lineares, a perda de energia por radiação pode ser considerada desprezível.

Por outro lado, quando a aceleração é perpendicular à direção da velocidade, a emissão de radiação é mais eficiente. Essa característica é aplicada em aceleradores de partículas conhecidos como síncrotrons, em que feixes de partículas são forçadas a percorrer trajetórias curvilíneas, emitindo radiação que pode ser usada para diferentes fins (como a pesquisa científica a exemplo do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, em Campinas (SP), o primeiro acelerador de partículas do tipo síncrotron do hemisfério).

Com relação a elétrons em um fio condutor, pode-se entender o que ocorre empregando uma abordagem qualitativa bastante simples. Quando o fio está submetido a uma diferença de potencial os elétrons adquirem velocidade, mas colidem com os íons da rede metálica, transferindo a energia cinética adquirida. Os íons da rede metálica, por sua vez, adquirem essa energia e aumentam o movimento oscilatório em torno de suas posições de equilíbrio, o que é perceptível como aquecimento do fio no bem conhecido efeito Joule. Como resultado desse movimento oscilatório dos íons, o fio emite radiação eletromagnética.  Essa radiação é, na temperatura ambiente ou um pouco acima, principalmente na faixa de infravermelho, perceptível pelo aquecimento da região em torno do fio, mas pode chegar até a faixa do visível, se o fio for aquecido em demasia como nas antigas lâmpadas de incandescência.


2 comentários em “Radiação de partículas carregadas

  1. Daniel disse:

    Olá Professor,

    Quando foi dito “O que ocorre, e pode ser demonstrado usando a Teoria Eletromagnética, é que uma partícula carregada que está acelerada produz radiação eletromagnética”, a teoria eletromagnética descreve como esse processo funciona (de emissão de radiação); contudo, ela não explica o PORQUE isso precisaria ocorrer na natureza, certo? É mais no sentido de “já que observamos isso na natureza, vamos tentar explicar como ocorre, suas consequências e afim”. Talvez seja, não sei, seja o mesmo questionamento de “PORQUE o elétron tem a carga elétrica no valor X?” A teoria eletromagnética não apresenta uma resposta para essa questão, apenas para as questões que se seguem como “De experiências em laboratório chegamos a X para a carga do elétron. A partir disso, vamos estudar alguns fenômenos a, b, c etc…”

    Esse raciocínio está correto?

    • Fernando Lang disse:

      Não apenas a TEM, mas as teorias científicas em geral, ultrapassam em muito as observações e os experimentos de laboratórios. Teorias científicas são invenções, às vezes inspiradas em experimentos (nem sempre!), que não raro predizem fatos novos. A TEM exemplifica o avanço da teoria em relação à empiria, por exemplo, no caso das ondas eletromagnéticas: previstas teoricamente por Maxwell e posteriormente, depois de grande esforço experimental, detectadas em laboratório por Hertz.
      Então não é correto se afirmar que todo o conhecimento científico tenha gênese em experimentos. As observações e os experimentos sempre são iluminados por algo teórico que lhes antecede. Vide mais em PRINCÍPIOS em FÍSICA: induzidos ou deduzidos? A filosofia da ciência de Karl Popper.

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