Questão 67 sobre a corrida do Usain Bolt – Prova Branca – ENEM2015
25 de outubro, 2015 às 15:39 | Postado em Mecânica, Questões do ENEM, vestibulares, concursos
Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/Professor Lang
Há questões no CREF tratando do trabalho em um sistema que não é um corpo rígido e pelo que entendi o Teorema Trabalho-Energia Cinética na forma “o trabalho total (trabalho da força resultante) é igual à variação da energia cinética” vale apenas para uma partícula. Se isto é verdade, como se resolve a questão do ENEM sobre o trabalho total do corredor?
Agradeço seus comentários.
Questão. Uma análise criteriosa do desempenho de Usain Bolt na quebra do recorde mundial dos 100 metros rasos mostrou que, apesar de ser o último dos corredores a reagir ao tiro e iniciar a corrida, seus primeiros 30 metros foram mais velozes já feitos em um recorde mundial, cruzando essa marca em 3,78 segundos. Até se colocar o corpo reto, foram 13 passadas, mostrando sua potência durante a aceleração, o momento mais importante da corrida. Ao final desse percurso, Bolt havia atingido a velocidade máxima de 12 m/s.
Supondo que a massa do corredor seja igual a 90kg, o trabalho total realizado nas 13 primeiras passadas é mais próximo de
a)5,4 x10+2 J
b)6,5 x10+3 J
c)8,6 x10+3 J
d)1,3 x10+4 J
e)3,2 x10+4 J
Como bem apontaste o Teorema Trabalho-Energia Cínética na forma “o trabalho total (trabalho da força resultante) é igual à variação da energia cinética” é válido para uma partícula e também para corpos rígidos em movimento de translação pura.
Recordemos que o trabalho total sobre um sistema é, por definição, o somatórios de todos os trabalhos realizados por forças exercidas no sistema. As forças exercidas em um sistema podem ser classificadas em dois grandes grupos: as forças externas ao sistema e as forças internas ao sistema. Portanto o trabalho total em sistemas com estrutura interna usualmente não é simples de ser calculado pois para tanto há que se conhecer, além das forças externas e os seus respectivos deslocamentos, também as forças internas e os seus respectivos deslocamentos. Vide também Mais sobre o teorema trabalho-energia e a questão sobre o Bolt no ENEM-2015.
Um sistema como o corpo humano é obviamente não-rígido, com uma estrutura interna complexa, com subsistemas interagentes. Quando um homem se movimenta ou até quando se encontra em repouso, calcular o trabalho total no corpo humano é extremamente complicado. Até quando um homem está dormindo, acontecem processos internos ao corpo que determinam que haja um trabalho total sendo realizado durante o sono. A evidência disto é que consumimos energia até dormindo.
Pode-se demonstrar que a variação da energia cinética associada ao centro de massa de um sistema fornece apenas uma parte do trabalho total realizado no sistema. Um exemplo esclarecedor sobre isto é o caso de um corpo rígido em rotação pura, isto é, sem translação do seu centro de massa. Neste caso é fácil de entender que a energia cinética associada ao centro de massa do corpo permanece nula enquanto ocorre um trabalho total realizado no sistema, determinando que sua velocidade angular aumente ou diminua. Outro caso interessante está discutido em Girando e aumentando a energia cinética. Como surge a energia cinética extra?
A questão do ENEM é insolúvel com as informações fornecidas. Aliás, a única afirmação imediata para o valor do trabalho total realizado no Bolt é ser ele DIFERENTE da variação da energia cinética associada ao centro de massa do atleta, portanto maior do que 90×122/2=6480 J.
Os terríveis problemas de formulação diversas questões no ENEM, recorrentes em todas as edições do exame, decorrem também (não exclusivamente) do fato de que as questões pretendem ser “contextualizadas a qualquer custo”.
COMENTÁRIO ADICIONAL: O idealizador da questão, ao fornecer informações supérfluas (13 passadas, 3,78 minutos, 30 metros) induziu os respondentes em tentar a solução por outro caminho, tão inválido quanto aquele que está discutido acima. Muitos respondentes encontraram então a alternativa que expressa 8,6 x 10³J, conforme se pode observar em uma entre tantas perguntas com o mesmo teor que me dirigiram:
Se o senhor tiver tempo, dá uma olhada na questão 67 caderno branco, essa fala sobre Trabalho.
Como: Trabalho = Força x Deslocamento, e Força= massa x aceleração, Trabalho = massa x aceleração x deslocamento
a aceleração é fácil de achar> variação de velocidade/tempo
Dados da questão: massa=90kg / Tempo=3,78s / Vi=0 / Vf= 12m/s / deslocamento= 30m
Substituindo: Trabalho = 90 x 12/3,78 x 30 = 8,5… x 10³
Aproximadamente 8,6 x 10³ (letra C)
Mas nos gabaritos em que vi, a resposta é B. Onde errei?
Outras questões do ENEM-2015 comentadas no CREF:
- Questão ENEM-2015 sobre estilingues
- Questão do carro solar – ENEM 2015
- Questão sobre Óptica e Ibn Al Haytham – ENEM-2015
- Questão ENEM 2015 sobre interferência está mal formulada?
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Olá,
tens como explicar por que a segunda abordagem(Trabalho = massa x aceleração x deslocamento) é equivocada para resolução da questão?
Obs.: Levando em conta uma partícula rígida e não uma pessoa.
Obrigado.
Ela somente estaria correta se a aceleração fosse constante (além de considerar o corredor como uma partícula). As informações do problema permitem calcular a aceleração média. A aceleração de um corredor é grande na arrancada e depois diminui.
Mas dizer que a aceleração média da partícula é 12/3,78 no trecho não é equivalente a dizer que ela, a partícula, tem uma aceleração constante de 12/3,78 no fim das contas?
Sabemos que a aceleração aumenta e depois diminui, porém, o resultado é equivalente a uma aceleração constante de 12/3,78. Não é?
Mais uma vez, obrigado pela ajuda.
Não é! Se a aceleração não é constante, o trabalho para ser calculado a partir da força é diferente do produto da força média pelo deslocamento. Se pensares em termos estritamente cinemáticos talvez fique mais claro de entenderes. Se a aceleração não é constante, o deslocamento não pode mais ser calculado pelas conhecidas equações do movimento uniformemente variado. Calcula o deslocamento do Bolt nos 3,78 s iniciais supondo que sua aceleração seja constante e igual à aceleração média.
Tens razão. A conta não fecha.