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Propulsão de objetos espaciais: o que impede que se atinja a velocidade da luz?

Boa tarde!

Já entendi, aqui mesmo neste blog (Propulsão de foguetes no espaço: como é possível o empuxo se não existe atmosfera?), que para haver propulsão não precisa haver atmosfera.

Como sabemos, no vácuo não existe resistência do ar. Sendo assim, pq um objeto espacial não pode continuar acelerando continuamente até atingir velocidades próximas da luz?

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

A razão para não ser possível atingir a velocidade da luz nada tem a ver com a resistência que um meio possa oferecer ao movimento de um corpo material.

A razão é consequente da Teoria da Relatividade que implica em que a energia cinética de um corpo tende ao infinito quando sua velocidade se aproxima da velocidade da luz. Ou seja, apesar de em princípio a velocidade pode ser sempre aumentada, ela nunca assumirá o valor da velocidade da luz. A velocidade da luz é o limite superior, que não pode ser alcançado, apenas aproximado.

As equações 1 e 2, onde m é massa do corpo, V e c são os valores da velocidade do corpo e da luz, derivadas respectivamente na Mecânica Newtoniana e na Mecânica Relativística, indicam como calcular a energia cinética K:

O gráfico de Figura 1 representa a energia cinética por unidade de massa de um corpo predita pela Mecânica Newtoniana (equação 3) e pela Mecânica Relativística (equação 4).

No gráfico da Figura 1 a linha vermelha, indicando a velocidade da luz, não é cortada pela curva azul, evidenciando que a energia cinética relativística tende a infinito quando a velocidade do corpo tende para a velocidade da luz. Já a linha verde, que indica como se comportaria a energia cinética caso a Mecânica Newtoniana fosse sempre válida, implica não haver limitação a priori para o crescimento da velocidade.

Constata-se na Figura 1 que as linhas azul e verde são indistinguíveis para velocidades pequenas quando comparadas a da luz. Se calculadas as energias cinéticas pelas equações 3 e 4 é fácil verificar que a diferença percentual entre os dois valores é apenas 0,75% para V=0,1c, crescendo para 3% quando V=0,2c e quando V=0,5c tal diferença já atinge 20%. Assim fica bem caracterizado que para baixas velocidades (V<0,1c) ambas as equações fornecem praticamente o mesmo valor, corroborando que a Mecânica Newtoniana é consistente com a Mecânica Relativística no domínio das pequenas velocidades.

Para objetos macroscópicos como projéteis e naves espaciais a velocidade de 0,1c está muito acima do que até hoje a tecnologia permitiu alcançar! O recorde de velocidade é o da Sonda Parker que alcançou 690.000km/h ou 0,00064c.

Se um corpo se deslocar com a velocidade da Sonda Parker, ele tem uma energia cinética por unidade de massa que não pode ser discernida no gráfico da Figura 1 mas que se calculada por qualquer uma das duas equações resulta em 1,84×1010J/kg. Como a unidade de medida da abcissa no gráfico corresponde  a 9×1016J/kg, o valor para a Sonda Parker é cerca de dois décimos de milionésimos dessa unidade de medida.

O valor de 9×1016J/kg, quando comparado com a densidade  energética do hidrogênio (substância que apresenta a maior densidade energética entre os combustíveis) de 1,43×108J/kg, resulta ser 630milhões vezes tal máxima densidade energética. Este resultado indica que se necessita transferir para um corpo de 1kg a fantástica quantidade de energia que se pode obter na combustão de 630milhões de quilogramas de hidrogênio para lhe conferir a velocidade de cerca de 0,9c (mais precisamente 0,87c) conforme se deduz do gráfico da Figura 1. E se for fornecida o dobro desta energia a sua velocidade crescerá para cerca de 0,94c, demonstrando assim que por mais energia que se forneça a velocidade da luz é inalcançável.

“Docendo discimus.” (Sêneca)


3 comentários em “Propulsão de objetos espaciais: o que impede que se atinja a velocidade da luz?

  1. Mais uma vez espetacular o comentário do professor Fernando Lang sempre muito didático e preciso.

  2. MARCELO DA SILVA VIEIRA disse:

    De fato, se hipoteticamente uma quantidade de massa chega a 99,9999999% da velocidade da luz, e quer se colocar ela a uma velocidade de 99, 99999999% da velocidade da luz, aumentando apenas uma casa decimal na velocidade, a energia cinética passa de 7071 mc^2 para 22361 mc^2. Só para este pequeno incremento na velocidade de 0,00000009%, a energia necessária deve se aumentar mais de 3 vezes. E a medida que se for chegando cada vez mais próximo de c, vai se aumentando ainda mais a ordem de grandeza da energia necessária para aumentar a velocidade da particula por um pequeno incremento.

  3. Professor Fernando Lang dando um show de didática em física e dessa forma estimulando a que o estudante, o interessado, os colegas e até o curioso façam uma imersão nos assuntos relacionados ao tema.
    Meus agradecimentos professor!
    Forte abraço

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