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Nível da água em um recipiente contendo água e gelo que funde (ENEM 2015 – Q.54).

Professor: uma dúvida de sala de aula sobre a questão mencionada acima surgiu hoje acerca de uma questão do enem. O questionamento se deu ao fato de não citar – na questão – nada sobre o comportamento anômalo da água. Como poderíamos abordar isso de forma mais concisa? Segue a questão! Forte abraço!

ENEM 2015 – Questão 54. Sabe-se que nas proximidades dos polos do planeta Terra é comum a formação dos icebergs, que são grandes blocos de gelo, flutuando nas águas oceânicas. Estudos mostram que a parte de gelo que fica emersa durante a flutuação corresponde aproximadamente 10% do seu volume total. Um estudante resolveu simular essa situação introduzindo um bloquinho de gelo no interior de um recipiente contendo água, observando a variação de seu nível desde o instante de introdução até o completo derretimento do bloquinho.

Com base nessa simulação, verifica-se que o nível da água no recipiente

A) subirá com a introdução do bloquinho de gelo e, após o derretimento total do gelo, esse nível subirá ainda mais.

B) subirá com a introdução do bloquinho de gelo e, após o derretimento total do gelo, esse nível descerá, voltando ao seu valor inicial.

C) subirá com a introdução do bloquinho de gelo e, após o derretimento total do gelo, esse nível permanecerá sem alteração.

D) não sofrerá alteração com a introdução do bloquinho de gelo, porém, após seu derretimento, o nível subirá devido a um aumento em torno de 10% no volume de água.

E) subirá em torno de 90% do seu valor inicial com a introdução do bloquinho de gelo e, após seu derretimento, o nível descerá apenas 10% do valor inicial.

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

Ao ocorrer a fusão do gelo no copo com água a temperatura do líquido diminui e com isso há variações de volume e densidade da água líquida. Entretanto tais variações são muito pequenas conforme se infere do gráfico da figura 1 que representa a densidade da água líquida, na pressão de 1 atm, na faixa de 0°C a 100°C.

A variação da densidade da água líquida a 1 atm é apenas 4% da densidade máxima de 1g/cm3. No gráfico da figura 1 não é perceptível o conhecido efeito da dilatação anômala da água. Para que ele seja representável deve-se restringir a faixa de variação da temperatura para próximo de 0°C conforme a figura 2.

Este não é o único comportamento anômalo da água. Vide as postagens Propriedades da água e Dilatação da água na fase sólida.

Portanto, apesar de acontecerem mudanças na densidade da água quando a temperatura se altera, elas são pequenas e podem desprezadas na solução do problema. Ou seja, para fins práticos considera-se a densidade da água constante.

A figura 3 representa o recipiente contendo água e um bloquinho de gelo. Quando o gelo funde o líquido resultante ocupa o mesmo volume que a parte submersa do bloquinho ocupava abaixo da superfície do líquido. Desta forma, o nível da água no recipiente não se alterará durante a fusão. Pode-se demonstrar a verdade desta conclusão a partir da Lei de Arquimedes (que impropriamente é chamada de Princípio de Arquimedes  conforme posto em  Princípios e Leis em Física e em O PARADOXO HIDROSTÁTICO DE GALILEU E A LEI DE ARQUIMEDES).

A demonstração da invariância do nível da água no recipiente será feita a seguir sem se recorrer à Lei de Arquimedes, sem se referir o empuxo, partindo-se das condições de equilíbrio do conteúdo do recipiente e da Lei de Stevin. Conforme indicado na figura P é peso do conteúdo do recipiente, isto é, o peso da água líquida e sólida no recipiente. O valor do peso (P) é igual ao valor da força no fundo do recipiente (F) pois todo o conteúdo está em repouso. Ou seja, P=F.

O valor da força vertical F que o fundo recipiente faz sobre o líquido é o produto da diferença de pressão entre a superfície livre da água e o fundo pela área A do fundo. Mas esta diferença de pressão é, em acordo com a Lei de Stevin, o produto da densidade d da água pela aceleração da gravidade g e pela altura h (desnível entre o fundo do recipiente e a superfície livre da água). Ou seja, F= d.g.h.A.

Como o valor do peso (P) do conteúdo do recipiente não se altera durante a fusão, o valor da força F não se altera. Mas como F= d.g.h.A, a altura h deve permanecer inalterada durante a fusão caso a densidade da água permaneça constante.

A figura 4 apresenta três fotos de um experimento realizado com o intuito de ilustrar a solução da questão. Conforme se observa o nível da água se eleva quando o gelo é adicionado, permanecendo inalterado quando fusão se completa.

O célebre físico, prêmio Nobel de 1938, Enrico Fermi teria relatado (?) que errou um problema em que uma pessoa estava em um barco flutuando em uma piscina. Perguntaram-lhe o que aconteceria com o nível da água na piscina quando a pessoa pulasse do barco e flutuasse na piscina. Usando-se o mesmo raciocínio sobre a invariância da pressão no fundo da piscina e sua dependência com o nível da água, é fácil se concluir que o nível não se altera.

Como desafio fica aqui a seguinte pergunta: caso o barco que flutua na piscina contivesse tijolos e estes fossem jogados para dentro da piscina, o nível da água na piscina aumentaria, diminuiria ou ficaria constante? Poste sua resposta no comentários com sua justificativa.

Outras postagens sobre fluidos e flutuação estão em Estática de Fluidos.

“Docendo discimus.” (Sêneca)


5 comentários em “Nível da água em um recipiente contendo água e gelo que funde (ENEM 2015 – Q.54).

  1. Fernando disse:

    “…caso o barco que flutua na piscina contivesse tijolos e estes fossem jogados para dentro da piscina, o nível da água na piscina aumentaria, diminuiria ou ficaria constante?…” O nível da água da piscina diminuiria!!! No barco, o tijolo desloca uma quantidade de água de peso igual ao do tijolo, portanto, de maior volume que o tijolo. No fundo da piscina, o tijolo desloca apenas um volume de água igual ao seu próprio volume.

  2. Vinicius Pereira de Almeida disse:

    No desafio, considerando a água e o barco + tijolos como um sistema, podemos dizer que, enquanto os tijolos estão dentro do barco, o centro de massa do sistema se encontra num ponto mais acima do centro do recipiente, ou seja, o centro de massa fica num ponto mais próximo do barco. Quando os tijolos são jogado para dentro d’água, os mesmos afundam, por serem mais densos que água, indo para uma região mais baixa do sistema água-barco-tijolos. Com isso, o centro de massa do sistema sai de um ponto mais alto para um ponto mais baixo. E, nesse processo, o centro de massa tem que ter uma aceleração vertical para baixo, ou pelo menos alguma componente vertical dirigida para baixo.
    Contudo, para que isso ocorra a soma das forças externas sobre o sistema (F = d.g.h.A e P = peso do sistema) deve resultar verticalmente para baixo, portanto F < P. Então, se d.g.h.A < P e, considerando a água um líquido incompressível, logo sua densidade não muda, logo h deve diminuir.
    Bom tentei.

    • Fernando Lang disse:

      Este é um bom argumento para quando os tijolos estão caindo aceleradamente. Mas finalmente eles não terão aceleração pois estarão em repouso no fundo. Aliás, se a piscina for suficiente profunda, os tijolos atingirão velocidade constante (portanto aceleração nula) antes de chegarem no fundo.

      Quem sabe pensas mais um pouco! 😉

  3. Felipe Ben disse:

    Aqui vai minha sugestão de resolução: inicialmente a força no fundo da piscina é somente aquela exercida pela água, que usando a lei de Stevin poderia ser expressa como F = dghA. Quando o tijolo é arremessado para fora do barco e afunda, teremos no fundo da piscina a força exercida pelo contato do tijolo com o fundo + a força exercida pela água. Como a massa total dentro da piscina não se alterou, a força resultante sobre o fundo da piscina não deve se alterar. Logo o nível da água deve diminuir, de modo que a força exercida pela água no fundo da piscina reduza e “compense” a nova força de contato entre o tijolo e o fundo.

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