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Campos eletromagnéticos NÃO são produzidos por outros campos: as fontes de campos eletromagnéticos são sistemas materiais carregados!

Esta postagem é decorrente de uma extensa e produtiva discussão iniciada no Facebook em 04/11/2016, estendida por vários dias com diversos participantes -professores Renato Brito Bastos Neto, Felipe G. Ben, Alexandre Medeiros (UFRPe), Alexandre Tort (UFRJ), Gildemar Carneiro dos Santos (UFBA), Fernando Lang da Silveira (IF-UFRGS), tendo como ponto de partida a pergunta do aluno de ensino médio Hernan Ribeiro:

– Professor Fernando Lang, um campo magnético gera um campo elétrico certo? Pensando nisso, é possível gerar eletricidade a partir do campo magnético de dois imãs? Estou com essa dúvida…

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - IF-UFRGS

Fernando Lang da Silveira –  Aos campos magnéticos VARIÁVEIS no tempo estão associados com campos elétricos.  Começa olhando FEM de movimento.

Hernan Ribeiro – Obrigado professor! Compreendi melhor agora

Alexandre C Tort (UFRJ) –  A propósito da afirmação inicial da postagem: campos não podem gerar campos. Campos eletromagnéticos são gerados por cargas e correntes. As soluções gerais de Jefimenko para as equações de Maxwell deixam isto claro pois envolvem as fontes (e o tempo retardado).

Fernando Lang da Silveira – Interpretar relações funcionais entre grandezas físicas como relações causais é um equívoco recorrente não apenas no Eletromagnetismo.

Renato Brito Bastos Neto – Alexandre C Tort mas é no vácuo……… a propagação da onda eletromagnética não ocorre exatamente porque a variação do E gera um B que, por sua vez, ao variar, gera o E “seguinte” e assim por diante ? E no vácuo teoricamente não tem cargas eletricas. Fernando Lang da Silveira e aih ?  🙁

Fernando Lang da Silveira – As equações de Maxwell para o vácuo DESCREVEM AS RELAÇÕES entre os campos eletromagnéticos. Entretanto a fonte da onda que se propaga no vácuo é um sistema material com cargas em movimento.

Alexandre C Tort –  Acho que o Fernando Lang respondeu ao seu questionamento Renato, interpretar relações funcionais entre E e B como relações causais é um equívoco. Quanto à segunda parte do seu questionamento, as ondas que se propagam no vácuo foram geradas alhures onde estão as fontes. Quando falamos propagação no vácuo estamos falando da zona longínqua, onde a aproximação de ondas planas é válida. O vácuo estritamente falando é um problema para as equações de Maxwell, pois nesse caso E e B são uniformes e constantes.

Alexandre C Tort – Uma discussão relativamente simples da radiação: http://www.if.ufrj.br/~pef/producao_academica

Fernando Lang da Silveira – Legal mas eu quero ver mesmo é a discussão menos simples!  🙂 De fato não dá para tratar este tema em um “apanar de mãos”.  Em que disciplina usas este texto?

Alexandre C Tort – Fernando Lang da Silveira é “simples ” porque trata da radiação de um sistema simples: a radiação emitida por um dipolo elétrico. Mas o formalismo está lá: potenciais retardados, campos E e B do dipolo para a zona próxima, intermediária e longínqua, vetor de Poynting, potência média emitida. Usei uma vez em Tópicos de Física Clássica II disciplina do MPEF e MNPEF. Resultados um pouco decepcionantes.

Fernando Lang da Silveira – Imagino a decepção pois os alunos (e eu também!) patinam na matemática.

Renato Brito Bastos Neto – Essa linguagem do calculo vetorial não ajuda muito.  Eu estava tentando visualizar fisicamente mesmo, sem o ferramental matemático. Pensei que a variação do E gerasse um B fechado que, ao sugir, geraria o próximo E (fechado) e a coisa ia se propagando indefinidamente mesmo distante da fonte que são as cargas elétricas.

Felipe G. Ben –  Acho que uma analogia boa é a mudança de tempo e espaço de um referencial para o outro na relatividade especial. Elas acontecem ao mesmo tempo e existe uma relação entre elas, mas uma não é a causa da outra. Da mesma maneira, o campo elétrico e o magnético oscilantes foram produzidos pela aceleração das fontes, e existe uma relação entre o campo elétrico resultante dessa oscilação e o magnético, mas não que um esteja realmente criando o outro.

Fernando Lang da Silveira – Infelizmente a transposição didática desse assunto está ainda para ser feita de maneira adequada. Acho que a mensagem central da discussão é que as fontes de campos são as cargas (e as correntes) e não outros campos.

Hernan Ribeiro –  Iai José Jackson entre na discussão com esses feras!

Fernando Lang da Silveira – As feras aqui são mansas! 🙂

Alexandre Medeiros – A dúvida levantada pelo Renato Brito é usual e bastante pertinente, mas ela encerra o equívoco de se ignorar as fontes referidas pelo Alexandre C Tort, assim como o problema do que se toma como sendo o VÁCUO. Se quisermos considerar a questão mais detalhadamente não podemos prescindir de fazer considerações relativísticas, como lembrou acima o Felipe. Neste sentido, a Força de Lorentz, por exemplo, pode ser vista como uma correção relativística da lei de Coulomb. http://fmnauka.narod.ru/Classical_Relativistic_Corrections_to_Coulomb_Law.pdf

Renato Brito Bastos Neto – Pessoal, essa explanação abaixo seria errada ?? ou correta ? Me corrijam por favor:

“Existem 2 tipos de campo elétrico:

1) O Campo Eletrostático, gerado por cargas elétricas, ele é conservativo, suas linhas de campo são sempre abertas. Nele é possível definir o conceito de potencial e energia potencial elétrica.

2) O Campo Não Eletrostático, ele não é gerado por cargas elétricas em movimento, mas sim, por campo magnético B variavel (lei de Faraday Lenz). Ele não é conservativo, suas linhas são sempre fechadas, não é possível nesse caso se definir o conceito de potencial elétrico nem de Epot elétrica.”

Me ajudem didaticamente a corrigir o que merece correção nessa exposição acima. Alexandre C Tort, Alexandre Medeiros , Fernando Lang da Silveira , Jailson Honorato .

Alexandre Medeiros (UFPe)- Caro Renato Brito, a questão que você levanta é complexa pois envolve muito cuidado na identificação das verdadeiras origens de tais CAMPOS ou das FORÇAS deles decorrentes. Como o Alexandre C Tort explicou acima, a CARGA (ou a CORRENTE) está em OUTRO LOCAL e nós apenas costumamos omitir a sua existência e nos referirmos sem muito rigor a uma suposta “interação entre os campos”. Falamos frequentemente, sem muita atenção ou rigor, de um primeiro campo interagindo com outro campo e isso não está correto. CAMPOS interagem com CARGAS. Além disso, Renato, assim como os conceitos de CAMPO e VÁCUO são sutis, o conceito de CARGA também o é. E isso é importante nessa discussão conceitual; afinal o que nós chamamos de CARGA, em seu sentido mais amplo e não apenas no sentido elétrico é uma propriedade fundamental da matéria que nos informa o TIPO de FORÇA que aquela particular matéria SENTE. Assim a MASSA, a CARGA ELÉTRICA, o ISOSPIN e a COR (refiro-me aqui, evidentemente, ao tipo de CARGA associada à força nuclear e não a coisas como o vermelho e o azul 🙂 ) são associadas de modos diversos às quatro forças fundamentais. O importante nisso tudo, Renato, é não perdermos as REFERÊNCIAS a essas propriedades fundamentais da MATÉRIA (números quânticos) às quais estão associadas os diversos CAMPOS criados. É fácil e traiçoeiro abreviarmos a linguagem e esquecermos as origens dos mesmos. E isso, do ponto de vista filosófico, nos leva a uma postura idealista sobre a qual o Fernando Lang pode falar melhor, pois já escreveu vários textos bastante reflexivos sobre o papel da epistemologia na Física.

Alexandre Medeiros – Cristian Raduta (Physics Department – Ohio State University) estudou várias concepções alternativas mantidas por estudantes de Física sobre os significados envolvidos na Lei de Faraday. Eu recomendo a sua leitura para os interessados neste tema e também nos problemas cognitivos associados aos conceitos diretamente relacionados com a mesma. http://cds.cern.ch/record/828008/files/0503132.pdf

Alexandre Medeiros – Sem querer me alongar e já me alongando, 🙂 eu gostaria de recomendar também se tentar colocar essa discussão em um melhor contexto histórico que se reporte aos experimentos fundamentais que lastrearam o surgimento da lei de Faraday e que a interprete inclusive à luz da Relatividade, como assinalei acima. Neste sentido, um artigo clássico e conciso sobre o assunto foi escrito por Marazzini e Tucci (The Physical Meaning of Faraday’s Law from a Historical Point of View) no European Journal of Physics em 1983. Acho que os nossos amigos Fernando Lang, Alexandre C Tort, Renato Brito e demais interessados neste debate apreciarão a sua leitura. http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.175.1371&rep=rep1&type=pdf

Para lastrear reflexões mais profundas sobre o tema, eu recomendo também a leitura deste maravilhoso livro da Nancy Nersessian.

Fernando Lang da Silveira – Faço uma proposta para o item 2 do texto do Renato Brito Bastos Neto, aguardando críticas especialmente do Alexandre C Tort e Alexandre Medeiros: 2) O campo elétrico – não eletrostático – existe quando houver um campo magnético variável, isto é, produzido por cargas elétricas aceleradas. Ele não é conservativo, suas linhas são sempre fechadas, não sendo portanto possível lhe associar uma função potencial elétrico. “Docendo discimus.” 🙂

Alexandre C Tort – É possível escrever o campo elétrico como a combinação linear de campo conservativo mais um campo adicional não conservativo. Substituindo na lei de Faraday na forma diferencial, o rotacional do primeiro termo é zero, mas o do segundo não. O termo sobrevivente é formalmente relacionado com a variação temporal do campo indução magnética. Na formulação de Jefimenko, o termo adicional está relacionado com as variações temporais da densidade de carga e da densidade de corrente. Portanto, tens razão Fernando.

Alexandre Medeiros – Deixemos de lado a importante questão relativa ao campo não eletrostático não ser conservativo, pois este parece ser um ponto sobre o qual todos concordam e que poderia ser aprofundado em termos de componentes conservativa e não conservativa, o que entretanto não fugiria do problema central. A questão central, para mim, no texto redigido pelo Renato me parece ser o que o Fernando bem reelaborou. Enquanto o Renato assume a forma tradicional como muitos livros apresentam o assunto afirmando que: “O Campo Nao Eletrostático, não é GERADO por cargas elétricas em movimento, mas sim, por CAMPO MAGNÉTICO B variavel”; o Fernando Lang da Silveira NÃO nega o papel fundamental deste CAMPO MAGNÉTICO, mas remete a ORIGEM do CAMPO NÃO ELETROSTÁTICO ao fenômeno mais primitivo que criou este próprio CAMPO MAGNÉTICO, afirmando: ” O campo elétrico – não eletrostático – existe quando houver um campo magnético variável, isto é, produzido por cargas elétricas aceleradas”. Se assim não o fizesse, nós cairíamos no célebre paradoxo do ovo e da galinha. Mas, repito que esta forma CUIDADOSA de apresentar o tema NÃO é usual. Usual é nos referirmos descuidadamente até mesmo a uma PROPRIEDADE FUNDAMENTAL da MATÉRIA como a CARGA como se ela fosse uma COISA EM SI. Diz-se, frequentemente, por exemplo, coisas como: “uma carga de 2 Coulombs se move de um ponto A para um ponto B” OMITINDO, assim, que a CARGA é uma PROPRIEDADE e que falar deste modo é tão impreciso quanto dizermos “um vermelho se move de um ponto A para um ponto B …”

Fernando Lang da Silveira – Ótimo então. Pretendo salvar esta longa e interessante discussão no CREF. Por aqui é tudo muito volátil.

Alexandre Medeiros –  Fernando, ESSE tipo de DEBATE levantado pelo Hernan Ribeiro e pelo Renato Brito é MUITO INTERESSANTE e EDUCATIVO e pode realmente despertar a colaboração de diversos colegas (como aconteceu). Eles estão de parabéns! Algo MUITO DIFERENTE são aqueles DEBATES MALUCOS provocados pelos Mr Wikis da Vida sobre Motos Perpetuos, Leis de Newton equivocadas e outras tolices. É aquilo que eu sempre insisto sobre o FILTRO.

Renato Brito Bastos Neto –  Agradeço enormemente os comentários dos colegas Alexandre C Tort e Alexandre Medeiros sobre nesse rico debate, especialmente para mim que estou a evoluir mais e mais conceitualmente bebendo na fonte da sabedoria de vocês meus mestres. Eu enviei ao Fernando Lang da Silveira 2 livros de mecânica de minha autoria em cortesia para ele. Eu gostaria de presentear também o Alexandre C Tort e o Alexandre Medeiros com essa cortesia. São 2 livros de mecânica com abordagem fora do padrão, especialmente destinados para estudantes que vão prestar IME ITA e olimpíadas de Fisica. O vol 1 agora foi traduzido para o inglês e começará a ser vendido no site da Amazon americana para todo o mundo, quem sabe, a partir de Dezembro 2017.  Vou falar com vocês inbox para pedir seus endereços para envio das cortesias. Por gentileza, vejam suas mensagens filtradas aqui no Facebook.

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Comentários no Facebook entre 07/11/2016 e  09/11/2016

Gildemar Carneiro Dos Santos (UFBA) – É bom pensar sobre o assunto. Me parece estranho, mas tem gente mais especialista do que eu opinando.

Gildemar Carneiro Dos Santos –  Caro Fernando Lang da Silveira, gostaria de perguntar, nessa página de discussão, se não seria possível a existência a priori de uma onda eletromagnética sem a presença de fontes, já que isso não entra em conflito com as equações de Maxwell, da mesma forma como é possível a existência dos táquions, com velocidades superiores à da luz, desde que nunca passem a ter velocidades menores. Mas não sei como postar essa pergunta lá.

Fernando Lang da Silveira – Dá uma olhada no texto do Alexandre C Tort indicado na postagem.

Gildemar Carneiro Dos Santos – Agradeço sua atenção. Tive o cuidado de ler tudo, antes de escrever isso. Nas equações de Maxwell, uma onda eletromagnética com velocidade c satisfaz todas as equações no vácuo.Pelo que sei, os potenciais retardados aparecem quando as fontes não são nulas.

Fernando Lang da Silveira – Aguardemos alguma manifestação do Alexandre C Tort.

Alexandre C Tort – Gildermar e Fernando: uma onda eletromagnética pode propagar-se no vácuo, em particular, as ondas planas harmónicas e superposições lineares destas.. De fato ela é uma solução das equações das equações de Maxwell no vácuo. Vácuo no contexto significa muito longe das fontes!!!. São as fontes que geram a radiação eletromagnética. No vácuo clássico absoluto homogêneo e isotrópico (logo, sem fontes!!!! ) a solução compatível com a simetria transacional, rotacional e translações temporais é um campo E e um campo B uniforme e independente do tempo. Mas isto é algo que não é fisicamente real. . Nessas condições todas as outras soluções, onda plana por exemplo, são apenas matemáticas, não físicas. O universo físico não funciona assim. As equações de Maxwell estabelecem relações formais entre campos e fontes, elas não são causais. Basta ver que o tempo nestas equações é o instantâneo, o mesmo para campos e fontes, não há retardamento. A relação causal entre campos e fontes é dada pelas equações de Jefimenko que também são soluções das equações de Maxwell.

Alexandre C Tort -Fernando: Em tempo, no vácuo clássico total os campos uniformes e constantes que respeitam a simetria do espaço e do tempo são os campos E=0 e B=0; Como E e B são campos vetoriais, se forem uniformes e constantes darão uma direção preferencial ao espaço; logo, corrigindo-me: uniforme, constante -> E=0; B=0.

Gildemar Carneiro Dos SantosObrigado por colaborar com a discussão, Alexandre C Tort. Independente da interpretação subjetiva de que “vácuo quer dizer distante das fontes”, se J = 0 e ro = 0 nas equações de Maxwell, a solução “onda que se propaga com velocidade c” é obtida. Então a possibilidade de haver ondas eletromagnéticas mesmo que não existam cargas em nenhum ponto do espaço existe. Parece que o que leva a concluir a não existência como solução física seja a ideia de que ondas eletromagnéticas necessariamente são causadas por cargas. Mas a Física em si não impõe essa condição. Creio que passamos a entrar no campo da Filosofia da Física, que também é muito importante.

Alexandre C TortOndas eletromagnéticas são necessariamente causadas por densidades de cargas e correntes dependentes do tempo. As equações de Maxwell não são causais. A existência de Campos E é B em um universo sem fontes é uma hipótese não verificável. Além do mais viola a simetria do espaço-tempo.

Gildemar Carneiro Dos Santos –  Há casos em que soluções matemáticas não fazem sentido físico, como as funções não quadraticamente integráveis que não são usadas como funções de onda. Outros casos, como a possibilidade de inverter o tempo na Mecânica Newtoniana, não é verificado, e o fato de haver a possibilidade matemática mas não haver o fenômeno correspondente é visto como o enigma intrigante da flecha do tempo. Para um astrônomo que observa o céu, certamente toda luz provém de alguma matéria irradiante, e é bom que pense assim, mas acredito que, para alguém que estude os fundamentos da Física, não seria interessante descartar a possibilidade de ondas eletromagnéticas sem fontes, ou de asseverar que necessariamente toda luz seja causada pela matéria. Certo que se um fóton pode produzir um par de partícula e anti-partícula, essa teoria está fora do domínio clássico. São minhas elucubrações, mas gostaria de saber por que a existência de campos eletromagnéticos em um universo sem fonte viola a simetria espaço-tempo…

Alexandre C Tort – Em que direção e sentido no espaço e no tempo tais ondas acausais se propagariam?

Fernando Lang da Silveira – Ontem em conversa com um colega, que leu a discussão no CREF, mais uma vez aconteceu a confusão entre SABER e CAUSAR. Se sabemos que em um ponto do espaço existe um campo magnético variável então sabemos também sobre a existência de um campo elétrico (e vice-versa). Entretanto o conhecimento sobre algo e de sua relação com outro fenômeno não é suficiente para garantir que o primeiro cause o segundo. Aliás cabe uma pergunta se pensarmos que, por exemplo, a Lei da Faraday estabelece um nexo causal entre os dois campos: Qual deles é a causa e qual é a consequência? Esta discussão, como qualquer discussão científica, conforme já notou o Gildemar Carneiro Dos Santos, transita pela seara da Filosofia da Física.

Alexandre C Tort – Talvez fosse mais prudente considerar a lei de Faraday como uma correlação, mas todos sabemos que correlações não implicam necessariamente em causalidade. Para mim é claro: se acredito no princípio da causalidade não posso considerar a lei de Faraday como uma relação causal.

Fernando Lang da Silveira – O estabelecimento da relação de causalidade entre Y (efeito) e X (causa) envolve: 1 – a demonstração da variação concomitante (correlação) entre X e Y; 2 – a não antecedência temporal de Y em relação a X;  3 – a exclusão de outros fatores explicando a variação concomitante.

Alexandre C Tort – À primeira vista a lei de Faraday rot E= -d/dt B com X=rot E e Y= d/dt B parece satisfazer os três critérios. Ou não?

Fernando Lang da Silveira – Acho que não. A equação estabelece a correlação entre Y e X. A questão relevante é: X não é causado por Z? E Y também não é causado por Z?

Alexandre C Tort – Ok. (1) há correlação; (2) X e Y são simultâneos ergo Y não antecede X e vice-versa; (3) Há outros fatores que expliquem a correlação X e Y? Se Z= equações de Jefimenko para E e B, segue que devo provar explicitamente com essas soluções que rot E=- d/dt B. Naturalmente isto é possível caso contrário Z não seria solução geral das equações de Maxwell. Ufa!!!

Fernando Lang da Silveira – E se existisse uma relação causal entre os dois campos, por que B seria a causa de E (como usualmente se diz) e não o inverso? A Lei da Faraday é insuficiente para responder.

ADICIONADO EM 13/12/2022: vide o artigo na RBEF Las relaciones causa-efecto en las ecuaciones de Maxwell y sus implicancias en la enseñanza del electromagnetismo en los cursos introductorios de Física

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4 comentários em “Campos eletromagnéticos NÃO são produzidos por outros campos: as fontes de campos eletromagnéticos são sistemas materiais carregados!

  1. Rafael disse:

    Professor Fernando Lang, antes de tudo, quero lhe agradecer pelo seu trabalho aqui no CREF, que é de imensa valia para mim e acredito que para tantos outros também. Após essa proveitosa discussão, ainda me resta uma dúvida acerca da causalidade dos campos, especificamente falando, da lei de Faraday. Compreendo que campos eletromagnéticos são criados (pelo menos do ponto de vista da teoria eletromagnética clássica) por partículas aceleradas dotadas de carga elétrica ou por correntes elétricas. No entanto, no exemplo de um magneto que se aproxima de uma espira condutora, não é a taxa de variação do fluxo magnético (associado ao campo magnético do magneto) que gera um campo elétrico induzido ao longo da espira? Nesse exemplo, qual é a causa do campo elétrico induzido? Onde estariam as cargas aceleradas?
    Desde já, agradeço a atenção dispensada.

    • Fernando Lang disse:

      Parece-me que a resposta está aqui:
      Alexandre C Tort – É possível escrever o campo elétrico como a combinação linear de campo conservativo mais um campo adicional não conservativo. Substituindo na lei de Faraday na forma diferencial, o rotacional do primeiro termo é zero, mas o do segundo não. O termo sobrevivente é formalmente relacionado com a variação temporal do campo indução magnética. Na formulação de Jefimenko, o termo adicional está relacionado com as variações temporais da densidade de carga e da densidade de corrente. Portanto, tens razão Fernando.

      As cargas aceleradas se encontram então no magneto.

      • Rafael disse:

        Obrigado professor pela prontidão em responder. Perdoe minha insistência no assunto, mas eu ainda não consegui compreender. Se “É possível escrever o campo elétrico como a combinação linear de campo conservativo mais um campo adicional não conservativo”, que na formulação de Jefimenko corresponde, ao negativo do gradiente do potencial escalar mais o negativo da variação temporal do potencial vetor magnético, conforme https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/9db2099a46869f90064da65c3208d79790511e9a
        Assim sendo, o termo adicional referido por Alexandre C Tort, que “é formalmente relacionado com a variação temporal do campo indução magnética” quando substituído na lei de Faraday, corresponde ao negativo da variação temporal do potencial vetor magnético. Esse termo, segundo o artigo, é escrito em função da densidade de corrente, conforme
        https://wikimedia.org/api/rest_v1/media/math/render/svg/6fa14fef3372a2430829ad126836e3c92471360c
        Não consigo achar a relação com a densidade de carga referida por Alexandre C Tort: “Na formulação de Jefimenko, o termo adicional está relacionado com as variações temporais da densidade de carga e da densidade de corrente.”
        Poderia dizer que o movimento do magneto resulta em uma densidade de corrente? Essa densidade de corrente, corresponde as cargas aceleradas?
        Confesso que estou um pouco confuso =/.
        Agradeço imensamente o seu tempo disponibilizado.

        • Fernando Lang disse:

          Eu sugiro um sistema equivalente ao magneto – a bobina solenoide com corrente e sem núcleo ferromagnético – para entender onde se encontram as cargas em movimento que produzem o campo magnético e como tais cargas mudam seus movimentos quando o sistema é movimentado de forma a produzir a indução eletromagnética descrita pela lei de Faraday.

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