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Potência elétrica em resistores não varia com o quadrado da tensão aplicada? O caso do filamento de tungstênio nas lâmpadas incandescentes

Prof. Lang, li a postagem sobre a potência de uma lâmpada ligada em 220 V e 127 V – Lâmpada de 100 W e 220V ligada em 127 V.

Na internet encontrei muitos sites que afirmam que resistência da lâmpada é constante. O sr pode ver por exemplo em http://www.sofisica.com.br/conteudos/exercicios/eletrodinamica2.php sendo afirmado que “Se a lâmpada fosse ligada em uma rede com tensão diferente de sua tensão nominal, a única grandeza que seria mantida seria a resistência, pois depende apenas da sua fabricação.” A minha pergunta é se realmente existe uma variação grande na resistência elétrica de uma lâmpada quando a ddp que é aplicada se reduz à metade, a ponto de produzir uma modificação na potência diferente daquela que se calcula com a resistência constante. Agradeço a resposta.

 

Respondido por: Prof. Fernando Lang da Silveira - www.if.ufrgs.br/~lang/

Assumir a resistência elétrica como invariante frente à variações da tensão aplicada em condutores metálicos é correto desde que a temperatura do condutor se mantenha inalterada. O filamento de tungstênio de uma lâmpada incandescente passa por uma variação de temperatura de cerca de 2 mil graus célsius quando a tensão que se lhe aplica varia desde zero até a tensão nominal preconizada pelo fabricante da lâmpada. O gráfico da Figura 1 representa a variação da resistividade do tungstênio com a temperatura.

Nota-se que a resistividade, e consequentemente a resistência elétrica do filamento de tungstênio, cresce por uma ordem de grandeza quando o filamento passa da temperatura ambiente para a temperatura de operação da lâmpada (mais de 2000 K). Portanto assumir que a resistência elétrica seja constante ao longo de tão grande espectro de variação da temperatura é um pressuposto irreal. Entretanto, como é comum se insistir em tal pressuposto de forma incondicional (como bem exemplifica o texto indicado na pergunta), não é de se admirar que as pessoas se surpreendam quando fazem medidas em tais circunstâncias, como se pode ler  na postagem Como é que a resistência medida com o multímetro resultou ser cerca de 10 vezes menor do que resistência nominal de uma lâmpada?

Quando o filamento tungstênio tem a tensão reduzida à metade da tensão nominal, é difícil prever teoricamente qual é  a variação da temperatura que então acontece. Portanto quantitativamente é muito difícil também prever qual será a variação da resistência elétrica do filamento e por quanto a potência se desviará da potência calculada sob o pressuposto de invariância da resistência. Lembro que, sob o pressuposto de invariância da resistência, é fácil demonstrar que a potência se reduz a um quarto da potência inicial.

Entretanto é fácil medir o comportamento da potência em filamentos de tungstênio de lâmpadas incandescentes. Eu fiz tais medidas para lâmpadas de 127V com três diferentes potências nominais. O resultado das medidas estão expressos no gráfico da Figura 2. As medidas foram realizadas com auxílio de um variac, um amperímetro e voltímetro.

Vou usar os gráficos para fazer uma comparação entre as potências quando a tensão de alimentação baixa de 130V para 65V (portanto se reduz à metade). As lâmpadas, sob 130V, dissipam as potências elétricas de cerca de 234W, 154W e 116W. Quando a tensão foi reduzida para 65V, as potências efetivamente medidas ficam respectivamente em 80W, 52W e 39W.

O modelo que presume que a resistência elétrica é invariante frente à tensão aplicada prevê respectivamente 59 W, 39W e 29W contra, respectivamente, os valores medidos de 80W, 52W e 39W. A diferença percentual entre os valores previstos e medidos é cerca de -35% nos três caos. Dessa forma conclui-se que o modelo de resistência constante implica em importantes erros de avaliação das potências, as subestimando grosseiramente.

Finalmente apresento na Figura 3 os gráficos que expressam as medidas das resistências elétricas dos três filamentos de tungstênio em função da tensão que lhes é aplicada.

Nota-se nos três filamentos enormes mudanças no valor da resistência elétrica quando a tensão cresce de zero até a tensão máxima de 130V. Especificamente entre 65V e 130V as três resistências aumentam em cerca de 40% os seus valores.

Os comportamentos medidos nas três lâmpadas são universais para lâmpadas com filamento de tungstênio mas não se aplicam às velhas lâmpadas incandescentes com filamento de carbono. Naquelas antigas lâmpadas a resistência elétrica diminui quando a tensão elétrica aumentaa.

Vide também Potência elétrica em resistores não varia com o quadrado da tensão aplicada? O caso do filamento de carbono nas antigas lâmpadas incandescentes

“Docendo discimus.” (Sêneca)

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2 comentários em “Potência elétrica em resistores não varia com o quadrado da tensão aplicada? O caso do filamento de tungstênio nas lâmpadas incandescentes

  1. José Edison Sudani disse:

    Excelente matéria.
    Essa característica das lâmpadas incandescentes foi muito utilizada no passado para controle de ganho de geradores de áudio, geradores de sinais e outros equipamentos de precisão. Mantinham dessa forma o nível de saída constante. Toda vez que o nível de saída aumentasse, a resistência da lâmpada aumentava, reduzindo o ganho do circuito e o consequente nível de saída e vice versa.

  2. Carlo disse:

    Excelente!!!
    De grande ajuda para meu tcc, obrigado professor.

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